| Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 346 - 4 a 10 de dezembro de 2006
Leia nesta edição
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Professor ganha o Prêmio Scopus e conta a sua história,
que se confunde com a do Instituto de Química

Airoldi, o orientador sempre presente

Claudio Arioldi e o troféu da Capes em primeiro plano: quase 40 anos de Unicamp, com atuação decisiva na química inorgânica (Foto: Antoninho Perri)Claudio Airoldi, professor titular do Instituto de Química da Unicamp, acaba de receber em Brasília a primeira edição do Prêmio Scopus 2006. Iniciativa da editora Elsevier Brasil, com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), do Ministério da Educação, o prêmio contempla pesquisadores brasileiros que ao longo da carreira acadêmica apresentaram uma produção de excelência na Base de Dados Scopus, a mais ampla em resumos e referências existentes no mercado. O número de artigos publicados, de citações recebidas e de orientados também serviu de parâmetro para a seleção dos 16 agraciados na área das Ciências Exatas e da Terra. A Base Scopus integra o Portal de Periódicos da Capes, que a Elsever para a América Latina considera de importância essencial por sua abrangência no país.

Prioridade à formação
de recursos humanos

Contratado no início de 1968, Claudio Airoldi é o decano do Instituto de Química, mas esse título não deve evocar a figura do sábio velhinho de cabelos brancos e andar vagaroso. Aos 64 anos de idade e quatro décadas de Unicamp a serem completadas no final de 2007, Airoldi ostenta o mesmo porte físico dos tempos de futebol com os colegas da Química da USP, onde se graduou em 1967. Gestos contidos e fala pausada. No então recém-criado IQ da Unicamp, ele criou raízes como pesquisador e professor, construindo uma trajetória que em muitos aspectos se confunde com a história da própria unidade.

Claudio Airoldi teve participação significativa na área da química inorgânica, embora deixe esta valoração a cargo do observador. Mas sente-se recompensado. “Meus trabalhos não visam diretamente a aplicações práticas, envolvem aspectos interessantes do conhecimento, como o de interpretar determinados resultados de maneira quantitativa. Eles esclarecem, por exemplo, como ocorrem as transformações em certas superfícies, a importância de um determinado fenômeno de superfície e até sobre a separação de determinados metais em misturas. Se minhas pesquisas vierem a ter utilização prática, ótimo, mas particularmente estou interessado em ampliar o conhecimento”, afirma.

Airoldi orientou 39 teses, a maior parte de doutorado, que resultaram na publicação de mais de 300 trabalhos. A formação de recursos humanos, principalmente de doutorados e pós-doutorados, constitui seu objetivo fundamental. “Orientei alunos que em sua maioria exercem a docência em outras universidades. Tornaram-se pesquisadores que tocam com competência seus trabalhos e, de alguma forma, me sinto participando de seus sucessos. Esta propagação do conhecimento é o que mais me satisfaz. Podia estar aposentado já há muito tempo, mas vou continuar aqui fazendo esse trabalho até que permitam”.

Orgulhoso, Airoldi constata que o Instituto de Química se iguala a muitas instituições estrangeiras de peso em termos de aparelhagem, pessoal e produtividade: “Nossas publicações atestam isso e temos um alto contingente de alunos na pós-graduação. As dificuldades que enfrentamos são inerentes ao país e estão em geral relacionadas à falta de respostas rápidas às necessidades da pesquisa”, conforma-se. Como exemplo, o professor lembra como é demorada a importação de reagentes e que a manutenção de aparelhos importados torna-se um drama. “O pesquisador brasileiro experiente procura atalhos para contornar esses problemas e, com isso, nem sempre pode fazer o que julga mais importante; limita-se a selecionar o que é possível fazer. Os centros desenvolvidos evoluem muito mais rapidamente porque têm massa crítica e poderio tecnológico”.

Nesses 40 anos de Unicamp, Claudio Airoldi pouco se preocupou com cargos burocráticos. Chega muito cedo e admite que seu rendimento cai sensivelmente ao final do expediente. Mas conta com satisfação que ao realizar uma palestra em uma universidade do Nordeste, um ex-aluno o apresentou como “um orientador presente”, aspecto que nunca lhe havia ocorrido. “Então me dei conta de que estou aqui todos os dias e à disposição dos alunos e orientados”. Por ocasião desta entrevista ele estava de licença-prêmio e dispensado das aulas, mas nem por isso deixa de comparecer todos os dias à universidade. “Só tiro as férias regulares”, assegura.

O professor orgulha-se de certos preceitos, como o de sempre incentivar os alunos de pós-graduação a voltarem às suas universidades de origem para fazer pesquisa. “Nunca os motivei a procurar cargos políticos. Já entrei nisso levado pelas circunstâncias e não gostei. Ainda assim, um dos meus doutores faleceu quando se lançava candidato a reitor, outro foi reitor por oito anos e um terceiro está iniciando a caminhada para o mesmo cargo, todos eles em universidades do Nordeste”, recorda. Outra incitação aos alunos é para que ampliem seus conhecimentos. “Proponho um trabalho, mas na realidade espero que o aluno vá muito além, pois isso é importante para a vida e a carreira. Peço que aproveitem ao máximo o tempo na Unicamp, que é único e que muita gente não tem possibilidade de desfrutar”.

O calorímetro – O decano do Instituto de Química também foi seu primeiro doutorado (1970) e primeiro livre-docente (1979), tendo se tornado professor titular em 1988. “Airoldi possui uma ampla gama de interesses acadêmicos, uma prolífica produção científica e vem dando uma contribuição importante na formação de recursos humanos”¸ endossa o professor Ronaldo Pillli, atual diretor da unidade. O prêmio Scopus oferece uma oportunidade para que os colegas do IQ, representados pela diretoria, prestem sua homenagem a Airoldi. Convidado a dar uma conferência – antecedida de pequena recepção – neste dia 6 de dezembro, às 16 horas, no anfiteatro do Instituto, o professor escolheu um tema que para ele é emblemático: “A energética química como fonte de aprendizado, ensino e formação de recursos humanos”.

O tema é uma referência ao trabalho desenvolvido com alunos de graduação e pós-graduação com base no primeiro calorímetro introduzido no Brasil. Airoldi conta que, em meados de 1973, viajou para o pós-doutorado na Inglaterra, onde ficou um ano. “Quando retornei vivia-se o milagre brasileiro, havia dinheiro e investimento. Os poucos químicos da Unicamp que se propunham a realizar pesquisas em inorgânica buscavam rumos diferentes daqueles seguidos no país, o que os levou a decidirem pela compra de um calorímetro, instrumento extraordinário para a época. Fomos pioneiros e nos transformamos hoje em centro de excelência na América Latina”.

O professor recorda que ninguém do grupo sabia manusear o aparelho e explorá-lo constituiu um aprendizado do qual se beneficiaram alunos em todos os níveis. Outros calorímetros foram adquiridos depois, através órgãos de fomento, mas ainda são poucos os centros de pesquisa brasileiros que os possuem. Até hoje, Airoldi tem o calorímetro como sua principal ferramenta, sendo que as experiências acumuladas nesta área o levaram a integrar o corpo editorial da revista científica americana Thermochimica Acta. O decano chega a revelar certa surpresa com o Prêmio Scopus, mas se diz gratificado porque a homenagem vem desprovida de conotações políticas.

Origem modesta

“Minha origem é bastante humilde. Sou neto de camponeses, imigrantes italianos do norte da Itália – de Milão por parte de pai e de Mantova por parte de mãe – que se estabeleceram inicialmente nas fazendas de café da região de Araraquara. Posteriormente as famílias se transferiram para a região da Alta Paulista, inicialmente para Quintana, onde nasci, e depois para Osvaldo Cruz, onde conclui o colegial”, conta o professor Claudio Airoldi. Foi por influência do professor de história do colegial, que viu no aluno pendores para a pesquisa e o ensino, que Airoldi mudou-se para São Paulo, a 600 quilômetros da sua cidade, em busca da universidade e de trabalho para se sustentar.

Airoldi chegou à química – logo ela, a disciplina de ensino mais claudicante do colegial – quase por exclusão, pois percebeu que os professores eram dentistas, biólogos, matemáticos, físicos e engenheiros, mas nenhum era químico. “Uma vez na USP, fui sendo levado pelo curso. Quase cheguei à conclusão de que estava no curso errado, por causa das dificuldades e exigências, mas com o tempo fui me adequando. Hoje, se voltasse no tempo, faria tudo de novo”, garante.

Claudio Airoldi e seu colega José Atílio Vanin, já falecido, estavam na primeira turma do Instituto de Química da USP (entraram em 1964), e por isso eram alvos mais visados para o trabalho. Esta circunstância determinou a vinda de ambos para a Unicamp. “Foi no dia do meu aniversário, 4 de outubro de 1967, que o professor Geraldo Vicentini nos procurou depois da aula e disse que estava sendo montada uma universidade nova em Campinas. Esclareceu que no início seria apenas para lecionar, mas que podíamos fazer o doutorado paralelamente na USP”. Airoldi começou a dar aulas na Unicamp em 1968 e ao apresentar a tese de doutorado no Instituto de Química, em 1970, pôde efetivamente voltar para o interior, como era seu desejo.

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