Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 218 - 30 de junho a 06 de julho de 2003
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Lavagem de dinheiro
Debret: do pincel à pena
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História escondida em mochilas
Coleção Brasil Nunca Mais inclui “anexos” com material
apreendido de militantes e que serviu como prova de “subversão”

LUIZ SUGIMOTO

A Coleção Brasil Nunca Mais é de longe a fonte de onde mais bebem os pesquisadores que recorrem ao acervo do Arquivo Edgard Leuenroth (AEL) da Unicamp. Em 29 anos de existência, o AEL coletou e organizou perto de 50 fundos e coleções, além de livros, publicações e documentos avulsos que chegam sem parar para alimentar estudos sobre a história social, política e cultural recente do Brasil. Fruto de projeto nobre e meticuloso coordenado por D. Paulo Evaristo Arns e pelo reverendo James Wright, a coleção BNM foi doada à Unicamp em 1987, com 707 processos militares movidos contra suspeitos de subversão no período da ditadura, totalizando 1,2 milhão de páginas.

Brasil Nunca Mais vem embasando a produção de livros, filmes, documentários e teses de mestrado e doutorado, oferecendo informações e números sobre mortos e desaparecidos políticos, perfil dos atingidos, absurdos jurídicos em prisões e condenações, formas e instrumentos de tortura, depoimentos dramáticos das vítimas, fotos comprovando as sevícias. Até maio deste ano, foram 325 consultas, equivalente ao triplo da procura pelas coleções do Ibope e do Teatro Oficina, que aparecem a seguir entre as mais folheadas.

Em agosto de 2002, a BNM foi formalmente disponibilizada (o acesso já era público) à Secretaria de Justiça e da Defesa da Cidadania, visando ao levantamento de provas e informações para fundamentar e acelerar processos de indenização em favor de vítimas com seqüelas de torturas físicas ou psicológicas praticadas pelos agentes da repressão. (Leia matérias nos endereços fornecidos nesta página). A promulgação da lei prevendo o pagamento destas indenizações pelo Estado, refletiu no aumento acentuado de consultas aos volumes onde os processos estão ordenados com eficiência, facilitando a busca de informações por parte de familiares e vítimas da ditadura.

Contudo, há uma parte da BNM menos conhecida do público – e não menos importante –, cujo conteúdo é especialmente atraente para o acadêmico, mas que requer dele uma paciência de garimpeiro para descobrir as preciosidades que lhe interessam. É a parte dos Anexos, reunindo o material apreendido em bolsos, mochilas, residências e aparelhos dos militantes, e anexado aos processos como prova da “subversão”. São 10.170 peças, entre atas, manuais de guerrilha e de montagem de bombas, jornais clandestinos, panfletos, textos doutrinários, correspondências pessoais etc. Descontando-se os textos com mais de uma edição e as duplicatas, temos aproximadamente 8.500 documentos diferentes, que permitem identificar 2.000 pessoas, 1.500 entidades e mais de 300 periódicos.

Lacuna – Os responsáveis pela Coleção Brasil Nunca Mais recordam, na apresentação dos Anexos, que o golpe de 1964 levou à apreensão de grande quantidade de material considerado subversivo em bibliotecas e arquivos públicos e particulares, abrindo enorme lacuna no patrimônio documental do Brasil. A polícia fez desaparecer livros e outros impressos que pudessem configurar a “infiltração” de idéias e doutrinas incompatíveis, antes e durante o golpe. Contudo, ao contrário de outras ditaduras no mundo, os militares brasileiros não destruíram as peças anexadas aos processos contra oponentes do regime.

Organizados em ordem cronológica, estatutos, atas de reuniões, correspondências, jornais e panfletos formam fontes primárias para conhecer como se estruturavam e agiam as organizações clandestinas e setores da sociedade no combate à ditadura, bem como para avaliar os fatores que levaram à derrota do movimento. O período de produção e reprodução do material vai de 1961 a 1977, adensando-se entre 1963 e 1972. É possível perceber, por exemplo, como o conjunto de segmentos sociais na oposição muda qualitativamente, atraindo setores progressistas do clero e o movimento estudantil entre 1967 e 1970. Daí até 1972, os documentos retratam o processo de reaglutinação e de autocrítica das organizações de esquerda, com a fragmentação das mesmas e o desencadeamento da luta armada.

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