Marcadores
moleculares do tipo microssatélites desenvolvidos pela pesquisadora
Melissa de Oliveira Santos-Garcia no Laboratório de Análise
Genética e Molecular do Centro de Biologia Molecular e Engenharia
Genética (CBMEG) da Unicamp devem auxiliar no melhoramento
das leguminosas do gênero Stylosanthes, passíveis de ser
usadas em pastagens pelo setor agropecuário. Três espécies
do gênero, S. guianensis, S. macrocephala e S. capitata,
estudadas por meio dos marcadores, apresentaram variabilidade
genética e taxas de cruzamento relevantes para melhoramento
e produção de sementes. Por serem espécies nativas, essas
forrageiras, associadas às gramíneas - comumente usadas
em pastagens - podem representar redução de custos para
o setor. Segundo a pesquisadora, em estudos anteriores,
essas espécies se mostraram eficientes em solos de baixa
fertilidade, além de conter nutrientes importantes para
o animal.
Melissa explica que, devido
à capacidade das leguminosas de transformar o nitrogênio
atmosférico e fixá-lo no solo, seu uso é indicado como uma
alternativa mais econômica para a recuperação das pastagens.
“Além de serem propensas ao cruzamento e apresentarem vários
acessos disponíveis em bancos de germoplasma (unidades conservadoras
de material genético de uso imediato ou com potencial de
uso futuro), essas forrageiras são facilmente encontradas
no Brasil, maior centro de origem e diversidade do gênero”.
Mas, mesmo sendo o primeiro, o país tem pouca informação
disponível sobre a composição, a distribuição e a variação
genética das espécies do gênero. Nesse sentido, marcadores
do tipo microssatélite podem fornecer informações úteis
inclusive na obtenção de sementes de qualidade genética
superior, segundo Melissa.
“Realizar o cruzamento a
partir de dados genéticos é fundamental em programas de
melhoramento e conservação genética porque permite delinear
melhores estratégias de amostragem da variabilidade e selecionar
modelos mais adequados para as estimativas de parâmetros
genéticos de interesse”, afirma Melissa. O conhecimento
da quantidade e da distribuição da diversidade genética
dentro das coleções investigadas é importante para que os
programas de melhoramento possam utilizar de forma adequada
os bancos de germoplasma.
A pesquisa, desenvolvida
durante a tese de doutorado de Melissa, “Estudo da diversidade
genética e da taxa de cruzamento em Stylosanthes spp. através
de marcadores microssatélites”, orientada pela professora
Anete Pereira de Souza, do Departamento de Biologia Vegetal
do Instituto de Biologia da Unicamp e do CBMEG, e co-orientado
pela pesquisadora Rosângela Resende (Embrapa Gado de Corte/MS),
já rendeu a publicação de três artigos nas revistas especializadas
Molecular Ecology Resources e Conservation Genetics Resources,
dos Estados Unidos. De acordo com a pesquisadora, três artigos
estão em revisão.
“O Brasil tem mais cabeças
de gado que gente”, diz a orientadora Anete, que prossegue
informando que o agronegócio de sementes de forrageiras
é do mesmo tamanho que o de sementes de milho. “O agronegócio
é igual ao do milho, mas há poucas pesquisas e poucas empresas
envolvidas, portanto, é altamente rentável para quem está
nele atuando. É um mercado aberto para entrada de novos
participantes, além da necessidade de se produzir mais variedades
e sementes de variedades melhoradas para atender ao mercado
existente”, acrescenta.
Os marcadores constituem
ferramentas importantes para estudos futuros que possam
auxiliar no melhoramento e na conservação das espécies,
assim como no entendimento da estrutura de populações naturais,
segundo Melissa. Eles não se limitam às espécies contempladas
na tese, pois outros pesquisadores, a partir de agora, podem
aprimorar o conhecimento de características de outras espécies.
A pesquisadora enfatiza
que muitos métodos de determinação da taxa de cruzamento
ainda são baseados apenas na taxonomia e na biologia floral
das plantas, mas a união das metodologias de análise oferece
respostas mais precisas quanto às taxas de cruzamento e
ao conhecimento da variabilidade genética existente. Ela
explica que, antes da pesquisa com marcadores, acreditava-se
em taxas próximas de zero, mas, ao final do estudo, a espécie
S. capitata apresentou taxa de 31% e a S. guianensis, 26%
.
Grande parte das espécies
do gênero, segundo Melissa, tem suas taxas de cruzamento
desconhecidas ou estimadas apenas com base em caracteres
morfológicos, que podem sofrer influência do ambiente. Os
métodos modernos, como os marcadores de Melissa, devem contribuir
para a facilitação de futuras investigações sobre números
e tipos de alelos (partes diferenciadas do gene) que levem
a um cruzamento adequado com vistas ao melhoramento.
Controvérsias
Os resultados obtidos com os marcadores devem causar uma
mudança significativa no entendimento da classificação da
espécie S. guianensis, que apresenta uma taxonomia (classificação)
controversa. O que se tinha até o momento na literatura,
segundo a pesquisadora, eram dois estudos: o do pesquisador
holandês t’Mannetje, que considera que S. guianensis é composta
por sete variedades botânicas; e outro do português Nuno
Costa, que, durante sua permanência no Brasil, afirmou que
seis dessas “variedades” sugeridas por ’Mannetje são outras
espécies. “O dr. Nuno Costa viu que só dentro de uma das
variedades havia uma variação muito grande e que ela poderia
ser classificada como uma nova espécie e ainda dividida
em quatro variedades com base nessa variação.”, afirma Melissa.
“Até o momento, todos na
literatura apoiam a classificação feita pelo holandês, mas,
agora, com os resultados obtidos pelos marcadores, pudemos
reafirmar a classificação feita por Nuno Costa”, revela
Anete Pereira de Souza.
O impasse de mais de 20
anos entre as classificações portuguesa e holandesa justificam
a importância do desenvolvimento de marcadores moleculares,
como os desenvolvidos por Melissa. “É muito importante para
o uso de diferentes plantas em cruzamentos conhecer suas
relações filogenéticas. Além disso, é preciso saber se uma
é próxima da outra ou não, conhecer as relações genéticas
para se ter uma classificação correta. É preciso saber se
a planta se autofecunda ou cruza com outras plantas”, acrescenta
a pesquisadora.
O trabalho foi realizado
a partir do Banco de Germoplasmas de Stylosanthes da Embrapa
Gado de Corte (Campo Grande-MS) e da Embrapa Cerrados, em
Brasília, parceiras da orientadora Anete Pereira de Souza
em projeto sobre o desenvolvimento de plantas forrageiras,
financiado pelo CNPq e pela Fapesp, dentro do qual vários
alunos do Laboratório participam desde 2005.
A Unicamp, ao lado da Embrapa,
intensifica o desenvolvimento de trabalhos com plantas forrageiras.
A professora explica que são trabalhos de pré-melhoramento,
que podem contribuir em muito para o trabalho de melhoristas.
“Cada vez que apresentamos os resultados dos trabalhos com
marcadores, os melhoristas se surpreendem com a quantidade
e a qualidade das informações, muito úteis aos programas
de melhoramento”, acrescenta Anete.
A orientadora explica que
existiam alguns estudos com gramíneas, mas na área de desenvolvimento
de marcadores para forrageiras leguminosas tropicais o de
Melissa é um dos primeiros. “Apesar de estudos feitos anteriormente,
nenhum privilegiava a área de pré-melhoramento”, observa
Anete.
Ela acrescenta que quando
foi procurada pela Embrapa, existiam 15 espécies de interesse
aos programas de melhoramento, nos bancos de germoplasma
sem conhecimentos genéticos básicos e necessários. “Havia
um grande potencial que não era usado por falta de conhecimento.
São forrageiras exóticas e brasileiras. O projeto é tão
gratificante e necessário que, com o tempo, outras unidades
da Embrapa foram se envolvendo”, informa.