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Projeto de planetologia comparada
revela descobertas sobre Marte

Professor do IG lidera grupo cujas pesquisas estão
fundamentadas em métodos de sensoriamento remoto


ISABEL GARDENAL

O engenheiro geólogo e professor do IG Carlos Roberto de Souza Filho: trabalho em rede gera publicações em série nas revistas mais conceituadas do mundo (Foto: Antônio Scarpinetti)Estar cada dia mais perto de Marte é, para o engenheiro geólogo Carlos Roberto de Souza Filho, professor do Instituto de Geociências (IG) da Unicamp, Carlos Roberto de Souza Filho, uma das peculiaridades mais interessantes do seu trabalho no momento. O docente, alunos do IG e uma numerosa equipe de pesquisadores nacionais e internacionais estão envolvidos, nos últimos anos, em um projeto de planetologia comparada que estuda ambientes análogos entre os planetas Terra e Marte, sob patrocínio da Nasa (Agência Espacial Norte-Americana). Além do mérito e impacto do trabalho, ele tem revelado várias descobertas científicas, ainda que “a distância”.

As pesquisas desenvolvidas pelo grupo são fundamentadas em dados e métodos de sensoriamento remoto (SR), um ramo da ciência que aborda a obtenção de informações sobre um determinado alvo através de um dispositivo qualquer (sensor), sem que haja contato direto com o fenômeno sob investigação. Em Marte, o SR é utilizado para extração de informações sobre a composição mineralógica de solos e rochas presentes na superfície a partir de suas respostas espectrais – a capacidade de refletir ou absorver luz solar em diferentes comprimentos de onda do espectro eletromagnético. Estas respostas são estudadas analogamente na Terra e vice-versa, na tentativa de compreender o ambiente de formação dos minerais e de mapear materiais favoráveis à preservação de bioassinaturas (fósseis) ou mesmo para a manutenção de alguma forma de vida.

Os primeiros trabalhos foram conduzidos em uma área da Serra dos Carajás, no Pará, que reúne um conjunto de rochas muito antigas portadoras de microorganismos fossilizados, cujos registros em imagens de SR fornecem diagnósticos, o que potencializa sua detecção análoga na superfície de Marte, caso um conjunto similar de rochas exista naquele planeta. O artigo Brazilian Analog for Ancient Marine Environments on Mars, publicado pela equipe de Carlos Roberto em setembro de 2008, na EOS Transactions da American Geophysical Union, apresenta os resultados preliminares dessa investigação.

O engenheiro geólogo e professor do IG Carlos Roberto de Souza Filho: trabalho em rede gera publicações em série nas revistas mais conceituadas do mundo (Foto: Antônio Scarpinetti)Evidências
Outros dois ambientes na Terra que têm sido abordados como análogos particularmente pelo professor são lagos salinos e crateras de impacto de meteoritos. Ele explica que os lagos salinos compreendem situações extremas para sustentação de vida atual na Terra, mas a do tipo microbiana é amplamente observada em lagos posicionados em áreas desérticas presentes em quase todos os continentes. Várias evidências reveladas em Marte nos últimos anos apontam para a ocorrência desse tipo de ambiente durante a sua evolução, onde água líquida acumulada em amplas áreas no planeta teria evaporado, propiciando a deposição e o acúmulo de minerais hidratados na superfície.

Para estudar essa hipótese, lagos salinos (ou evaporíticos) foram aproximados e o destino levou Carlos Roberto e uma equipe da Nasa à Oceania em 2008 e neste ano. Lá fizeram levantamentos de campo e estudos de SR no Oeste da Austrália. Os primeiros resultados das duas expedições foram publicados em março de 2009 na revista Geochimica et Cosmochimica Acta, um dos periódicos de maior impacto científico na área de Geociências e Ciências Planetárias do mundo.

Conforme aponta o geólogo, “desde que uma família de novos sensores remotos foi colocada a bordo de satélites na órbita de Marte na última década, a superfície marciana passou a ser imageada constantemente e cada vez em maior detalhe”. Um desses sensores, menciona, o Omega (Visible and Infrared Mineralogical Mapping Spectrometer), foi lançado pela Agência Espacial Europeia (AEE) em 2003, a bordo do satélite Mars Express. Era do tipo hiperespectral e “enxerga’ a luz solar refletida na superfície de Marte em centenas de bandas espectrais, viabilizando a identificação remota de vários minerais, tal como é feito na Terra.

Foi com base nos dados gerados por esse sensor, detalha o geólogo, que minerais formados na presença de água líquida foram identificados pela primeira vez fora da Terra. Essas determinações sustentaram uma divisão da história evolutiva de Marte, proposta pela equipe da AEE, com base nas diferenças mineralógicas verificadas ao redor do planeta, justamente considerando a presença de sais e argilas. Estudos sobre a origem desses minerais levaram o grupo a propor a hipótese de que, em algum momento, houve uma mudança em escala global no ambiente de Marte que passou de condições de alteração aquosa em condições “quasi-neutras” (o que favorece a deposição de argilas) no período denominado Noachiano para um sistema evaporítico ácido (o que favorece a deposição de sais) no período Hesperiano.

O engenheiro geólogo e professor do IG Carlos Roberto de Souza Filho: trabalho em rede gera publicações em série nas revistas mais conceituadas do mundo (Foto: Antônio Scarpinetti)Aceitação
Essa hipótese defendida pelos pesquisadores europeus teve grande impacto e aceitação na comunidade internacional. Perdurou inquestionável por anos até que um importante breakthrough realizado pela equipe de Carlos Roberto foi publicado em outubro de 2009 na revista Geophysical Research Letters, sob o título Contemporaneous deposition of phyllosilicates and sulfates: Using Australian acidic saline lake deposits to describe geochemical variability on Mars.

O artigo, liderado pela pesquisadora Alice Baldridge (pós-doutoranda da Nasa e orientanda do professor), revelou que os lagos salinos da Austrália têm como principal característica uma grande variação de pHs, entre ácido, neutro e alcalino, separada vertical e horizontalmente por poucos metros. Os dados foram suficientes para demonstrar como essas condições distintas podem coexistir num mesmo ambiente. Carlos Roberto comenta que dois minerais marcam as diferenças ambientais importantes nos lagos australianos: sulfatos (sais) e filossilicatos (argilas). “Mais interessante: ambos são detectáveis a distância por sistemas de sensoriamento remoto a bordo de aviões e satélites”, conta. Pela demonstração de que ambientes aquosos mais diversos e variáveis podem ter coexistido em Marte e de que existe uma associação espacial de argilas e sais naquele planeta, em analogia aos verificados na Terra, o trabalho foi considerado um dos Paper Highlights de 2009 pela American Geophysical Union (AGU), organização sem fins lucrativos de geofísicos.

“Descobrimos, a partir de observações no terreno e com base em imagens hiperespectrais obtidas a partir de aviões e satélites, que as argilas e sais presentes nos lagos salinos australianos são formados em ambientes extremamente dinâmicos e que sua deposição pode ocorrer de forma quase simultânea. Situações similares em Marte foram mapeadas por nós e por outros grupos de pesquisa, com base em dados gerados pelos rovers Spirit e Opportunity e a partir de satélites, mas a nossa interpretação original do sistema é o que muda tudo e isso terá um impacto significativo para as futuras missões em Marte”, dimensiona o geólogo. “Por exemplo, vista a comum associação de microorganismos com esses ambientes de lagos salinos ricos em argilas e sais na Terra, por que não podemos ter microorganismos marcianos equivalentes? Acredito também que com esse trabalho abrimos um leque de opções sobre locais onde novas sondas devem ser enviadas para Marte na próxima década.”

Rede
O engenheiro geólogo e professor do IG Carlos Roberto de Souza Filho: trabalho em rede gera publicações em série nas revistas mais conceituadas do mundo (Foto: Antônio Scarpinetti)Crateras de impacto de meteorito são ambientes que também têm sido explorados como análogos. O estudo sobre impactos na Terra e a analogia do processo ocorrido em outros planetas é um tema que passou a ocupar um espaço especial na “agenda de interesses planetários” de Carlos Roberto, desde que publicou seu primeiro artigo na revista Science, em maio de 2002, sobre o tema. A partir dali, constituiu uma rede multidisciplinar que conta, além de alunos da Unicamp, com estudantes, pesquisadores e docentes da Stellenbosch University (África do Sul), do Imperial College (Inglaterra), do Jet Propulsion Lab da Nasa, do Instituto Astronômico e Geofísico da Universidade de São Paulo (IAG-USP) e do Instituto de Geociências da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Essa rede de pesquisa é hoje a mais produtiva do Brasil no estudo de crateras de impacto, com numerosas publicações, a última também publicada na Geochimica et Cosmochimica Acta, na edição de setembro, intitulada “Generation, mobilization and crystallization of impact-induced alkali-rich melts in granitic target rocks: evidence from the Araguainha impact structure, central Brazil”. O seu autor principal, Rogério Machado, recém-concluiu o mestrado orientado pelos professores Carlos Roberto e Cristiano Lana. “Estamos estudando atualmente várias crateras de impacto no Brasil, incluindo a de Araguainha (GO/MT) – a maior da América do Sul”, relata. Essas pesquisas, segundo o geólogo, visam não somente conhecer os processos e produtos de impacto na Terra, que têm implicações para a prospecção de minerais, óleo e gás, e aquíferos, mas também para estabelecer comparações com crateras de Marte e de outros planetas rochosos.

O engenheiro geólogo e professor do IG Carlos Roberto de Souza Filho: trabalho em rede gera publicações em série nas revistas mais conceituadas do mundo (Foto: Antônio Scarpinetti)Entre outras consequências positivas, os impactos revelam o substrato rochoso de Marte, o qual se encontra muitas vezes encoberto por solo e poeira, impedindo o acesso à informação sobre sua composição mineralógica a partir de sensores remotamente situados. “Assim, a investigação das crateras na Terra pode subsidiar a interpretação sobre quais são as rochas transformadas por impacto e quais são pouco afetadas pelo choque e, portanto, são mais próximas da rocha primordial, que pode conter análogos terrestres mais interessantes”, pontua o geólogo.

Atualmente professor titular do IG e Pesquisador 1A do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Carlos Roberto iniciou a carreira graduando-se em Engenharia Geológica pela Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop). Depois fez o mestrado na Unicamp e o doutorado na Open University/Milton Keynes, Inglaterra. Desde o seu doutorado, vem contribuindo para os avanços realizados no uso de SR em aplicações geológicas. Seu ofício tem possibilitado conhecer características da constituição geológica de diversos sítios na Terra e em Marte. O professor orienta alunos, coordena e participa de vários projetos e grupos de pesquisa nos EUA, na Austrália e na Europa. Alguns aspectos deste trabalho mostram a importância dos grupos nos quais está envolvido. O projeto de análogos Terra-Marte, por exemplo, foi o único aprovado pela Nasa no âmbito do Interdisciplinary Exploration Science Program em 2006, recebendo extensão de recursos até 2011.

O engenheiro geólogo e professor do IG Carlos Roberto de Souza Filho: trabalho em rede gera publicações em série nas revistas mais conceituadas do mundo (Foto: Antônio Scarpinetti)Interação
Esta interação garantiu o acesso do pesquisador e de seus associados a uma boa parte dos dados gerados sobre Marte pelas agências espaciais americana e europeia. A iniciativa vem sendo levada a efeito até hoje, quando dados obtidos, seja por satélites ou pelos rovers, por encomenda ou não, tornam-se acessíveis a membros da equipe. Carlos Roberto conta que este relacionamento com a Nasa tem sido bastante positivo, principalmente porque essa possibilidade de aproximação com a agência há cerca de 15 anos era bem mais complexa para pesquisadores baseados em países em desenvolvimento. O acesso aos dados de missões planetárias, exemplifica ele, normalmente era feito após vários anos, quando já havia esgotado boa parte das chances de descobertas mais importantes. “Daí então acontecia a sua liberação para a comunidade. Porém, agora, na medida em que integramos esses grupos internacionais, temos acesso aos dados numa certa condição de igualdade de oportunidade com nossos pares”.

Esse acesso ainda representou para os especialistas brasileiros uma maior aproximação com equipes multidisciplinares e que trabalham em rede para gerar publicações em série nas revistas mais conceituadas de Geociências e Ciências Planetárias do mundo. Ao falar acerca da inserção brasileira nessa nova política de compartilhamento globalizado de informações, Carlos Roberto classifica que as coisas estão ficando cada vez mais interessantes. De acordo com ele, depois de muitos anos investidos pelo país na geração de recursos humanos, hoje há pesquisadores de categoria internacional e com expertise para participar destes projetos de grande porte. “Além disso, a Unicamp continua sendo uma instituição capaz de atrair alunos e pesquisadores de classe mundial. Apesar do projeto Terra-Marte ser financiado pela Nasa, muitos dos laboratórios que têm proporcionado a geração de dados e suporte às investigações foram montados com recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), do CNPq e com o apoio desta Universidade.”

Desafios
Carlos Roberto sugere que tais avanços não devem parar mais. “Se nós, seres humanos, pretendemos estender nossa existência por vários outros milhares de anos, não há outra alternativa senão aquela da exploração espacial, de outros planetas terrestres. No caso de Marte, em algum momento nas próximas décadas, nós deveremos ter uma missão tripulada, com uma primeira equipe atingindo esse feito extraordinário. Torço para que tenhamos muitos geólogos envolvidos em todas as fases, quem sabe pessoal formado pela Unicamp”.

Do ponto de vista dos custos e dos riscos, situa ele, é muito melhor enviar numerosas missões não-tripuladas à Marte, particularmente as que incluam a locação de robôs e veículos automatizados no terreno e aéreos não-tripulados de baixa altitude, para o conhecimento detalhado do planeta. A exploração através de programas robóticos atuais e futuros proporcionará os conhecimentos fundamentais para exploração mais segura e previsível de Marte por humanos. O problema é que, mesmo Marte tendo uma dimensão cerca de 50% menor que a Terra, o planeta ainda assim é enorme.

Os robôs, mesmo das gerações futuras, dificilmente terão autonomia suficiente de energia e robustez para cobrir grandes extensões num terreno tão heterogêneo e mesmo inóspito. “Neste caso, será fundamental manter os trabalhos que nós e outros especialistas estamos fazendo quanto ao estudo de ambientes análogos Terra-Marte. Estes estudos nortearão o envio de missões robóticas futuras para locais relevantes que possam revelar cada vez mais evidências sobre a presença de água líquida passada e presente, e talvez algum tipo de vida naquele planeta”, considera o professor.

Outros planetas do sistema solar também têm sido objeto de estudo por sistemas de sensoriamento remoto. Além de várias missões bem-sucedidas a Marte no último decênio, “também tivemos a primorosa missão Cassini-Huygens, patrocinada pela Nasa, para o planeta Saturno e sua lua Titan”, observa Carlos Roberto. A sonda Cassini, batizada em homenagem ao italiano Jean-Dominique Cassini (1625-1712), que descobriu quatro das dezenas de luas de Saturno: Jápeto (ou Iapetus), Reia (ou Rhea), Tétis (ou Tethys) e Dione, já completou mais de quatro anos em operação, gerando informações sem precedentes sobre aquele planeta, seus anéis e luas. A missão Venus Express, da AEE, encontra-se em andamento no planeta homônimo, desde 2006. A missão Messenger tem como objetivo a investigação de Mercúrio – o satélite deverá entrar em órbita definitiva naquele planeta a partir de março de 2011. A exploração espacial, conclui ele, deu um grande salto de 2003 para cá, após um período grande de relativa estagnação.

Robôs móveis propiciam salto nas pesquisas

Em julho de 1997, a missão Mars Pathfinder obteve sucesso na colocação do pequeno rover Sojourner na superfície de Marte. Esta foi a primeira sonda terrestre que pousou em solo marciano, desde a era das sondas Vikings 1 e 2 (americanas) e das sondas Mars 2 e 3 (russas), na década de 70. Embora tenha gerado uma coleção de imagens inéditas da região em torno do pouso, esse rover tinha uma possibilidade muito limitada de locomoção. Foi a partir de 2004, com a chegada dos rovers Spirit e Opportunity, que um salto substancial ocorreu nos estudos sobre Marte. A missão dos rovers era prevista para durar no máximo seis meses, mas eles continuam se locomovendo pela superfície marciana já há seis anos.

Essa foi a primeira missão com robôs móveis, com possibilidade de locomoção a maiores distâncias. Ambos os rovers foram dotados de instrumentos para abrasão de materiais, análises microscópicas e espectroscópicas. Quando os rovers chegaram a Marte, um deles, o Opportunity, caiu acidentalmente dentro de uma cratera. O que parecia um problema logo se revelou como um achado de sorte. Esta cratera, gerada pelo impacto de um meteorito, apresentava uma formação rochosa exposta no seu interior que continha numerosas evidências geológicas de que a rocha observada era de origem sedimentar e de que foi alterada superficialmente em ambiente evaporítico – ou seja, dois processos em que a profusão de água líquida é fundamental. “Essa foi uma das principais descobertas dos últimos tempos em Ciências Planetárias”, ratifica Carlos Roberto. “Com tantas situações favoráveis para o surgimento de algum tipo de vida em Marte, há uma boa possibilidade de que sejam encontrados indícios num futuro próximo”.

Marte é um dos planetas mais próximos da Terra, em distância e constituição, compreendendo condições locais ainda “habitáveis”. Considerando a melhor situação entre órbitas relativas (o que ocorre a cada 25 meses na Terra) e com um plano de uso mínimo de combustível, são necessários cerca de somente sete meses para atingir o planeta. É um planeta coberto por sedimentos transportados pelo vento e possui uma fina atmosfera saturada em CO2. Algumas regiões são tão frias que o CO2 condensa-se sobre a superfície. Durante muito tempo, sustentou-se uma crença de que Marte seria um planeta “desértico e morto”. Entretanto, Marte não foi e não é o que parece. Quase 40 anos de pesquisas baseadas em sensores imageadores e não-imageadores revelaram que o planeta pode ter sido similar a alguns ambientes conhecidos na Terra, com água líquida correndo em sua superfície.

Tudo indica que Marte teve uma história muito parecida com a Terra até determinado ponto de sua evolução geológica, incluindo a presença de amplos corpos d’água (talvez oceanos) em sua superfície. É um planeta rochoso com atmosfera, hidrosfera e clima. Apresenta registros de condições e materiais a partir dos quais a vida poderia ter surgido (ou ainda existir) naquele planeta, em analogia à Terra. Portanto, entender quando e o que aconteceu, para efetivamente explicar a sua distinta condição atual em relação à Terra, é um desafio que pode trazer repercussões relevantes para o futuro.

O registro da presença passada de abundante água líquida no planeta foi destacado pela primeira vez a partir de imagens do satélite Mars Global Surveyor, que proporcionaram a observação de formas de relevo na superfície marciana, como grandes canais e ravinas, os quais somente poderiam ter sido formado pela erosão por fluxo de água. Com a chegada dos rovers Spirit e Opportunity ao solo marciano em 2004, evidências incontestáveis da presença de água líquida no passado de Marte foram reveladas, incluindo a detecção de diversos tipos de argila, sais e, mais recentemente, carbonatos. Na Terra, a operação desse universo de sensores a bordo de plataformas orbitais e voltados à observação do planeta é similar, compara Carlos Roberto. “Há uma diferença marcante, entretanto, nas aquisições a curta distância – aqui isso é feito por nós, geólogos, e não por robôs!”

Marte dá indícios de ter, como a Terra, cerca de 4,5 bilhões de anos, período quando se formou boa parte dos planetas do sistema solar. Na época da Guerra Fria, na corrida espacial entre americanos e russos, uma série de sondas de ambas as partes foram enviadas à Marte e pelo menos três delas pousaram efetivamente na sua superfície. Paralelamente, as missões Vikings compreenderam imageadores orbitais que enviaram as primeiras imagens mais detalhadas de um planeta distante. Hoje, a tecnologia envolvida na exploração é muito maior. Além da maior densidade de programas em Marte, os rovers e sondas estáticas, como a Phoenix (atualmente em operação no polo norte de Marte), são verdadeiros laboratórios ambulantes. “Novidades são produzidas quase diariamente em Marte com tantas missões em andamento”, comenta Carlos Roberto.

As próximas missões envolverão rovers e sondas ainda mais completas e complexas. O Mars Science Laboratory, um rover que deve iniciar suas operações em 2011, terá instrumentos específicos para a detecção de matéria orgânica na superfície marciana. As avaliações estão se tornando cada vez mais sofisticadas, revelando novos conhecimentos sobre Marte, sobre sua mineralogia e história evolutiva geológica, mas sem perder um dos objetivos principais de todas as missões: encontrar evidências de algum tipo de vida no planeta vermelho. Isso tem impacto em várias esferas, conforme Carlos Roberto. “Se conseguirmos comprovar a existência de vida em qualquer outro planeta, esta será a segunda evidência conhecida na história e isso definitivamente modificará a probabilidade da existência de vida no Universo. Por enquanto, nós e outros seres vivos que habitam a Terra somos a única evidência conhecida.”

 


 
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