Conceitualmente, o agroturismo envolve atividades turísticas e recreativas praticadas no interior de propriedades rurais, sem interferência nas atividades produtivas (agrosilvopastoris), que permanecem como as principais, e sob a premissa da conservação ambiental. Mantêm-se, portanto, a ambientação rústica e natural, a infra-estrutura simples, os espaços abertos e, quando oferecida, uma hospedagem informal. Geralmente são iniciativas dos proprietários em busca de um ganho extra, mas que em tese deveriam contribuir para fortalecer a economia local. Os passeios estão mais para o lúdico, diferentemente do ecoturismo, praticado por afeitos ao radicalismo da canoagem em corredeiras (rafting), descidas de cachoeiras (rapel), escaladas e caminhadas por trilhas virgens.
Negócio
pede ações
integradas de
proprietários
e prefeituras
O agroturismo surgiu no Brasil há apenas dez anos. Por isso, Bernadete Pedreira também passou por um aprendizado durante a pesquisa de doutorado visando criar uma metodologia para delimitar os espaços rurais com maior potencial agroturístico em municípios. Agrônoma da Embrapa Solos, no Rio de Janeiro, Bernadete conhecia somente de passagem a região pesquisada, que envolveu inicialmente nove cidades da bacia do rio Mogi-Guaçú, no chamado Circuito das Águas. A tese, que oferece boa ferramenta para o planejamento deste setor ainda incipiente, foi apresentada na Faculdade de Engenharia Agrícola (Feagri) da Unicamp, com orientação da professora Rozely Ferreira dos Santos (FEC).
“O agroturismo ainda é uma iniciativa isolada, não havendo integração entre os proprietários rurais e com o poder público municipal. Interessados em aumentar a renda, os proprietários procuram informações com vizinhos e amigos, sem preocupação com o planejamento e com o impacto que a atividade possa causar ao meio ambiente. Isto leva a uma somatória de erros e problemas. Esta pesquisa traz indicadores importantes que podem contribuir para esse planejamento e para a própria educação ambiental, que ainda é pequena entre os produtores”, afirma Bernadete.
Entre os principais indicadores para definir as melhores áreas para agroturismo estão os ambientais, como clima, relevo, recursos hídricos, vegetação natural, tipo e uso do solo, declividade; indicadores turísticos, como infra-estrutura de hospedagem, malha viária, atrativos turísticos; os relativos à pecuária e agricultura, como adequação de uso agrícola, tipos de cultura e de criação; e dados socioeconômicos. “Todos os indicadores foram espacializados, cruzados e integrados entre si sob a forma de mapas. Também foram mapeadas as áreas de restrição ambiental e/ou legal à atividade. A interseção das áreas propícias e a exclusão das áreas de restrição gerou um mapa das áreas de maior potencialidade ao agroturismo”, ressalta a pesquisadora.
Espaço ideal – Desta forma, das nove cidades iniciais, Socorro foi a selecionada pelo seu alto potencial à atividade. Os outros municípios avaliados foram Águas de Lindóia, Águas da Prata, Espírito Santo do Pinhal, Itapira, Lindóia, Santo Antonio do Jardim, São João da Boa Vista e Serra Negra. “E, a cada vez que aplicávamos o zoom na escala espacial, sobre a região e sobre os 448 quilômetros quadrados de Socorro, o detalhamento dos indicadores aumentava, até chegarmos à área ótima para o agroturismo. E, dentro dessa área, foi selecionada a Fazenda da Fartura”, acrescenta.
Na fazenda, a engenheira agrônoma encontrou uma série de atrativos para o turista: edificações tradicionais, equipamentos para beneficiamento de café e fubá, mata original, uma fauna diversificada, córrego, queda d’água e intervenções paisagísticas. Ao mesmo tempo, os cultivos de milho, feijão, café, abacate, cana e eucalipto; criações de bovinos, carneiros e apiário, além dos pastos, trilhas e boas vias de acesso e circulação interna. “O agroturismo envolve diretamente a produção agropecuária. O turista não precisa necessariamente ordenhar a vaca, mas vai conhecer o processo produtivo da propriedade, vendo como se planta e colhe café e morango, ou como se lida com gado e peixes”, exemplifica.
Bernadete Pedreira realizou um trabalho de campo intenso, munida do GPS, equipamento que permite indicar a localização dos pontos que interessavam ao estudo: corpos d’água, vegetação, áreas de erosão, edificações, etc. “A metolodogia utilizada na pesquisa contribui, através da geração de mapas e gráficos, não apenas uma avaliação das potencialidades do agroturismo, mas também de seus impactos nos níveis regional e municipal, até chegar à propriedade. É possível, assim, promover ações integradas entre produtores, prefeitura e municípios vizinhos visando a conservação ambiental e o planejamento adequado da atividade”, explica a pesquisadora.
Consciência – Bernadete reitera a importância da conscientização dos proprietários rurais, que em boa parte ignoram os impactos ambientais tanto das atividades do dia-a-dia como de agroturismo. “Há produtores que cultivam batata em área de declive, usando agrotóxicos que se deslocam para os rios; outros adotam espécies inadequadas na piscicultura. Eles também precisam estar cientes da importância de preservar (e repor) a vegetação, principalmente ao longo dos cursos d’água. Mesmo o pisoteio do gado e o vaivém de turistas pelas trilhas causam impactos. O enfoque do agroturismo não deve ser somente econômico, mas de sustentabilidade ambiental, a fim de que o agronegócio se mantenha produtivo e rentável por muitas gerações”.