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Método substitui a análise sensorial para
determinar índice de doçura de açúcares
Pesquisadores do IQ usam técnica de espalhamento
de raios-X associada à quimiometria; trabalhos rendem patente

CARMO GALLO NETTO

A professora Maria Izabel Maretti Silveira Bueno, coordenadora das pesquisas: ampla gama de aplicações práticas (Foto: Antoninho Perri)O poder adoçante de açúcares, expresso pelo índice de doçura, é obtido através de determinações sensoriais realizadas por pessoas devidamente treinadas para tanto. Mas hoje isso já pode ser realizado em laboratório utilizando a técnica de espalhamento de raios-X associada à quimiometria. O método, com patente já depositada pela Inova, desenvolvido pelo Grupo de Espectroscopia de Raios-X (GERX), do Departamento de Química Analítica do Instituto de Química (IQ) da Unicamp – sob a coordenação da professora Maria Izabel Maretti Silveira Bueno e participação das químicas Thais Levatti Alexandre e Karen Goraieb –, deu origem ao trabalho que apresenta o “Processo para classificação e determinação do índice de doçura em açúcares ou sacarídeos”.

Os trabalhos orientados pela professora Maria Izabel, utilizando espectrometria de espalhamento de raios-X associada à quimiometria, levaram, já em 2005, à requisição de cinco outras patentes envolvendo o método propriamente dito; a quantificação de alumínio em sílica; a quantificação de parâmetros da indústria petroquímica; a classificação de óleos vegetais, animais minerais e sintéticos; o controle de qualidade de medicamentos genéricos e similares; e o controle de amostras com composição orgânica. Essas pesquisas geraram duas dissertações de mestrado e três teses de doutorado e atualmente vários alunos estão envolvidos nelas.

Embora a técnica seja ainda recente, ela aponta para uma gama enorme de aplicações práticas: na indústria, para o controle de qualidade das matérias-primas, dos processos utilizados e dos produtos finais; nos órgãos de controle e regulação, para a verificação do produto que chega ao mercado. E tudo pode ser feito com cem segundos de irradiação, mantendo a integridade da amostra e a um custo muito baixo. A pesquisadora reconhece que, a exemplo de um remédio que leva tempo para chegar ao mercado, o método exigirá um certo tempo para que seja assimilado e possa se disseminar, mas aposta nessa possibilidade.

Parâmetros
Maria Izabel explica que a técnica de fluorescência de raios-X é utilizada tradicionalmente com o objetivo de se determinar a presença de substâncias inorgânicas em amostras, sendo, por isso, muito difundida em metalúrgicas, cimenteiras e refinarias de petróleo – neste caso, para determinação do teor de enxofre em petróleo.
O processo, entretanto, não era adequado para a quantificação de substâncias orgânicas, que provocam o espalhamento da radiação. Mas, com o advento da quimiometria, que permite detectar leves alterações no espectro, pôde-se começar a diferenciar amostras usando a região de espalhamento no espectro, passando-se a classificar amostras orgânicas, quantificar seus constituintes e medir propriedades, caso da determinação do índice de doçura.

Para determinar parâmetros desconhecidos de novas amostras, o método exige a elaboração de modelos, com amostras conhecidas, que são construídos com base em resultados obtidos por processos tradicionalmente validados. O processo, enfatiza a pesquisadora, pode facilitar sobremaneira o trabalho analítico de rotina. Ela esclarece: “No caso da patente em questão, sabia-se, ao criar o modelo, que a amostra irradiada era sacarose, frutose, glicose ou manitol. Desses açúcares, já se conheciam os índices de doçura determinados por análise sensorial. O que fizemos foi irradiar essas amostras e confrontar os espectros com os valores esperados para os índices de doçura, e observamos uma correlação linear. A modelagem estava então pronta para novos açúcares, dos quais não se conhece o índice de doçura”.

Maria Izabel diz que a metodologia é validada na medida em que é capaz de reproduzir os mesmos resultados obtidos ou por análise sensorial ou por outros processos analíticos validados. A vantagem é que no dia-a-dia, em análises de rotina, podem-se substituir esses processos de uso consagrados, mas mais lentos, trabalhosos e caros.

A gama de utilização do processo é muito ampla. Irradiando-se pêlos de ratos, é possível detectar a leishmaniose, e a irradiação de pêlos de cães pode ser utilizada para verificar a presença da hepatite B. Os pesquisadores do laboratório o tem utilizado para a verificação da veracidade de valores energéticos, carboidratos, proteínas e gorduras constantes dos rótulos de alimentos industrializados, como farináceos, chocolates e ovos.

O método, afirma a pesquisadora, foi desenvolvido para aplicação em análises de rotina, o que considera de grande valia nos processos industriais: “Em cem segundos de irradiação da amostra, pode-se confrontar o espectro obtido com um modelo já criado para avaliação. Para a criação do modelo, existem métodos oficiais que os órgãos governamentais preconizam, que são laboriosos, custosos, demorados, além de gerarem resíduos e serem suscetíveis a erros”.

 

Polímero sintético foi descoberto por acaso

Serendipicidade. É esta palavra, de origem persa, utilizada para nomear descobertas científicas que ocorrem ao acaso, que a professora Maria Izabel resgata para se referir à origem de suas pesquisas. A propósito, lembra que foi assim que se descobriu o primeiro polímero sintético, que se formou casualmente quando seu monômero foi submetido à pressão.

A docente conta que uma sua aluna de iniciação científica se propunha a verificar a validade da medicina ortomolecular, que, por vezes, utiliza o teor de inorgânicos no cabelo como status indicativo de saúde do cidadão. Diante da dificuldade de obter dados sobre as pessoas cujos cabelos seriam analisados, recorreu-se ao estudo de pêlos dos cães da raça poodle, que em geral são os mais tosados.

Através de clínicas veterinárias de Campinas e Sorocaba, onde sua aluna residia, conseguiram 60 amostras e 60 donos de cães que aceitaram responder a um detalhado e extenso questionário sobre a vida de cada animal. O objetivo era relacionar o status de saúde do cão com o teor de metais nos pêlos, a exemplo do que a medicina ortomolecular faz em relação ao homem, e julgaram que, para isso, seria muito adequado usar a florescência de raios X, um método que não destrói as amostras.

Ela conta: “Os pêlos foram somente lavados, secos, colocados em celas apropriadas e irradiados. Mas não se conseguiu nenhuma correlação entre os teores de metais e o status de saúde dos cães. Resolvemos, então, fazer o estudo quimiométrico, na expectativa de estabelecer essa correlação. Conseguimos diferenciar, pelo conjunto dos espectros, o sexo e a cor do pêlo do cão, informações que poderiam ser conseguidas apenas olhando os animais, sem necessidade de utilização de irradiação com raios X. Mas isso nos alertou para outras possibilidades, pois até então não se havia verificado a possibilidade de obter informações a respeito de amostras orgânicas complexas usando raios-X, como fenótipos relacionados à cor do pêlo e ao sexo. Isso ocorreu em 2002”. É o que a pesquisadora considera uma serendipicidade.

Ainda mais: havia algumas amostras que não permitiam estabelecer correlação tanto com a cor do pêlo como com o sexo. Verificaram, consultando o histórico de vida dos animais, que se tratavam de fêmeas que haviam sofrido de câncer de mama ou outros tipos de doenças, constatações que levaram a outros estudos, permitindo a verificação da hepatite B em cães e abrindo caminho para várias descobertas. Afinal, se sabe que o câncer e outras doenças podem alterar a estrutura do cabelo dos humanos e dos pêlos de animais.

A partir daí, o método foi testado para diferenciar espécies de bananas, sementes de flores da mesma família, cachaças que adquirem cor em tonéis de carvalho ou pela enganosa adição de xarope de açúcar e, mais recentemente, para medir o índice de doçura de açúcares.

Maria Izabel constata entusiasmada que as possibilidades da metodologia são inúmeras: “Temos conseguido sucesso na análise de cimentos, de zeólitas usadas como catalisadores nas torres de craqueamento do petróleo, na determinação da composição de vários alimentos, fluídos corpóreos (sangue e urina), de petróleo, óleos comestíveis, controle de qualidade de tintas e vernizes, etc. Podemos classificar vinhos segundo a composição, que por sua vez é indicativa de sua origem. Mas os degustadores podem ficar tranqüilos, porque eles sempre serão necessários para o estabelecimento e/ou validação do modelo”.

 

 
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