|
Para o lucro florescer
Agrônomo desenvolve ferramenta
de gestão que auxilia produtores de flores
Pesquisa de doutorado da Faculdade de Engenharia Agrícola
(Feagri) propõe um novo método de avaliação da gestão na produção
de flores em cultivo protegido. Desenvolvido pelo engenheiro
agrônomo Antonio Bliska Júnior e orientado pelo professor
da Faculdade Antonio Carlos de Oliveira Ferraz, ele foi batizado
como Método de Identificação do Grau de Gestão (Migg) nas
Atividades de Produção de Flores de Corte. O sistema permite
a autoavaliação pelo produtor com base em um questionário
com perguntas e respostas simples, as quais mostram um retrato
da situação da empresa, do sítio ou da propriedade dos interessados
em melhorar a sua organização. A proposta, que pretende facilitar
a vida do produtor na etapa de planejamento e a posteriori,
é capaz de apontar em uma hora como melhorar a gestão do negócio
com o uso de um gabarito. “Os testes foram positivos e agora
a intenção é replicar suas aplicações também em culturas de
frutas e hortaliças”, realça Bliska.
Esses testes, segundo seu
autor, foram feitos com 14 empresas do ramo de flores do Estado
de São Paulo e do Rio Grande do Sul. O trabalho, que agrega
valor administrativo e técnico numa só ferramenta, avalia
o estágio de gestão de propriedades agrícolas na produção
de flores de corte – flores decorativas vendidas já cortadas,
como as rosas, os crisântemos e as gérberas, entre outras.
A qualidade e a gestão são pontos preponderantes para atingir
o potencial de crescimento que ora o Brasil já demonstra,
avisa o engenheiro agrônomo.
A avaliação do pesquisador,
em razão das atividades de extensão da Feagri, exercidas junto
aos produtores rurais, que colaboram para as áreas de uso
de plástico, de estufas e de hidroponia, é que o produtor
atual possui conhecimento técnico profundo, mas infelizmente
não tem uma organização mínima para conduzir a sua atividade
e a sua produção de uma forma racional e mesmo empresarial.
A atividade que ele faz no seu dia a dia é muitas vezes empírica
e não consegue reunir informações para avaliar se as decisões
que está tomando são corretas, se está melhorando a produção
ou onde pode melhorar e também reduzir custos. Apesar de a
tese ter focado sua atenção no produtor de flores de corte,
a metodologia mostra-se, segundo Bliska, perfeitamente adaptável
para a produção de flores em vaso e outros tipos de produção
agrícola.
Bliska enfatiza que a maioria
dos produtores de flores está no Estado de São Paulo, onde
fica concentrada cerca de 70% da produção. Essa cadeia movimenta
cerca de R$ 3 bilhões anualmente. Trata-se de um número significativo
para a economia, gerando em torno de 120 mil empregos diretos
somente no Estado. Esses trabalhadores são os tratoristas,
pessoal de semeadura, produção de mudas, reprodução, colheita,
pós-colheita, embalagem, transporte, além, é claro, do produtor,
situado como um produtor de agricultura familiar (mesmo as
grandes empresas como as de Holambra são de origem familiar),
que começam modestamente e ampliam seus horizontes com mais
de uma área de produção. “Há produtores de Holambra que têm
áreas de produção em Minas Gerais e no Ceará”, exemplifica.
Para Bliska, é perfeitamente
compreensível que o produtor, pelo fato de estar mais afeito
às atividades do campo, tenha dificuldade de lidar com a administração
dos negócios em seu dia a dia. Procurou-se com a metodologia,
conforme o engenheiro, pesar os valores na balança e compreender
o que é mais e o que é menos importante ou como o produtor
pode adotar uma ferramenta que rapidamente o ajude a identificar
pontos fortes e fracos do empreendimento.
Autoavaliação
O Migg, ainda que baseado
em métodos já aplicados no mercado de maneira geral, voltados
às grandes e médias empresas, tomou como espelho a Fundação
Nacional de Qualidade e o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro
e Pequenas Empresas (Sebrae). Contudo, tais sistemas envolviam
uma avaliação complexa e demorada, com busca de consultores
externos às empresas que levavam meses para conduzi-la.
Com o novo método, o produtor
rural pode realizar uma autoavaliação, por meio de 64 questões,
sem a necessidade de consultar esses especialistas, já que
isso indubitavelmente tem um custo. E, além desse custo, tem
um tempo para o produtor levantar informações e, posteriormente
a este procedimento, há ainda uma análise a ser detalhada.
O que Bliska pensou foi um
jeito de reduzir este tempo com questões mais objetivas, e
conseguiu. “A grande facilidade é que o produtor se pauta
em perguntas e respostas simples, do tipo sim/não e tem/não
tem. Justamente por isso a avaliação é mais rápida, ao contrário
de outros métodos em que a pessoa é obrigada a descrever todas
suas atividades para obter um resultado que indicará o caminho
a ser tomado.” O pesquisador lamenta, porém, que “o produtor
não seja capaz de pensar o seu sítio e a produção como uma
empresa; este pode se constituir um problema de gerenciamento,
inclusive no aspecto do lucro”.
O
método sugerido por Bliska possibilita o uso de um gabarito
em que o próprio produtor consegue chegar a uma avaliação,
que lhe fornece um roteiro para implantação de melhorias na
gestão da sua atividade, do seu negócio e da sua empresa.
Na pesquisa, o questionário perguntava ao interessado, entre
outras questões, se a empresa ou o sítio possuía um plano
de negócio, se o produtor empregava equipamentos de proteção
individual nas aplicações de agroquímicos, como era avaliada
a satisfação dos clientes para os quais eles estavam entregando
as flores.
Observou-se que o produtor,
repetidas vezes, não tinha informações do seu negócio e que
o comércio era estabelecido através de cooperativas. Estas
cooperativas eram o cliente direto dele, mas não o cliente
final – o consumidor na floricultura e no supermercado. Por
conta disso, o produtor em geral não tinha feedback desse
consumidor final, posto que a informação chegava apenas à
cooperativa. A sequência de informações rompia-se ao longo
da cadeia.
Estuda-se, no momento, a publicação
desta metodologia como livro ou manual, destinado a priori
ao produtor. “Já produzimos a espinha dorsal. A intenção é
elaborar alguns mapas dessas atividades no Estado de São Paulo
e mesmo no Brasil. Para isso será preciso aplicar vários questionários
no país”, comenta. Bliska espera viabilizar o acesso do produtor
a essa ferramenta e estender a sua aplicação à produção de
frutas e de hortaliças.
Histórico
Há algum tempo, a produção
de flores no país era tida como uma atividade marginal. Iniciou
por volta da década de 50 de forma mais organizada e a sua
evolução tem ocorrido com maior visibilidade no Estado de
São Paulo, em razão, talvez, de o seu entreposto de comercialização
ficar situado na Capital. Isso tem crescido a tal ponto que
em Campinas também foi instalado um mercado de flores.
Os maiores produtores estão
distribuídos em Holambra, Atibaia e na região de Mogi das
Cruzes. Em Atibaia, explica o engenheiro, existe uma atividade
produtiva pouco menos organizada comercialmente, entretanto
tão tecnificada e com um volume de produção tão representativo
quanto a de Holambra, que ainda se constitui a maior referência
do Estado de São Paulo para comercialização porque, por meio
do sistema de leilão que foi instalado lá, acabou sendo referência
de preço. “Isso funciona como marco regulador para o restante
do mercado, inclusive de outros Estados”, esclarece Bliska.
Por outro lado, relata ele,
o mercado exportador é ainda pequeno, em vista do seu potencial.
Para se ter uma ideia, comparado à Colômbia, que exporta mais
de US$1 bilhão de flores de corte anualmente, o Brasil está
ensaiando os primeiros passos com valores da ordem de US$30
milhões por ano.
A exportação depende muito
da variação cambial, situa Bliska: quando o dólar está favorável,
o produtor tenta colocar o produto lá fora; quando está em
baixa, acaba colocando-o praticamente apenas no mercado interno.
“A sazonalidade do câmbio pode ser um problema. Contudo, hoje
o país conta com um bom potencial para consumo no mercado
interno, particularmente pela expansão de renda das classes
C e D. Assim sendo, o produtor acaba se dedicando mais ao
mercado interno”, informa.
Com isso, revela o autor da
tese, se perdem a oportunidade de colocação de flores no mercado
externo e a de geração de divisas com o atual modelo brasileiro
que não põe muita fé nas culturas de flores, frutas e hortaliças,
por serem julgadas menores. “Suas maiores preocupações são
carne, milho, soja, algodão, frango e suínos. Por este motivo,
os produtores encontram grande dificuldade para se organizar”,
pontua o engenheiro.
As exportações de flores,
frutas e hortaliças, argumenta Bliska, podem crescer se receberem
maior investimento, pela sua grande capacidade de geração
de renda, de empregos e fixação do homem no campo. Estas atividades
são conduzidas o ano todo, alimentando a cadeia dos que cultivam
e dos que comercializam. Logo, os produtores têm condições
de terem um trabalho fixo, evitando a questão do êxodo rural,
e uma série de outros fatores que não são bem apreciados na
avaliação dessas atividades. “A exportação deve crescer e
o gerenciamento pode auxiliar este crescimento, contudo há
muito o que fazer no mercado interno”, reconhece Bliska. “As
flores são a cultura que oferece maior dificuldade para questões
de gerenciamento, porque exigem um alto nível de tecnificação
na sua produção. Felizmente já despontam alguns trabalhos
no sentido de melhorar sua qualidade e o modo de gestão.”
Publicação
Tese de Doutorado: “Metodologia de
identificação do grau de gestão (Migg) nas atividades
de produtores de flores de corte”
Autor: Antonio Bliska Júnior
Orientador: Antonio Carlos de Oliveira
Ferraz
Unidade: Faculdade de Engenharia Agrícola
(Feagri) |
|
|