|
Biólogos utilizam plantas nativas
para recuperação de solo degradado
Duas
pesquisas de mestrado desenvolvidas no Departamento de
Biologia Vegetal do Instituto de Biologia da Unicamp (IB)
comprovaram a potencialidade de espécies nativas para
fitorremediação de solos de áreas degradadas ou contaminadas
com metais.
Os
estudos estão voltados para a recuperação dessas áreas,
utilizando plantas nativas em substituição a atividades
demoradas e dispendiosas. Sarah Caroline Ribeiro de Souza
analisou a tolerância de três espécies arbóreas – eritrina,
guapuruvu e sansão do campo (usada em cercas-vivas) –
a altos níveis dos metais pesados chumbo e zinco.
Lucas
Anjos de Souza optou pela análise da contribuição de fungos
micorrízicos arbusculares para o desenvolvimento e a potencialização
fitorremediadora de espécies leguminosas herbáceas. Os
micorrízicos são fungos que se associam às raízes favorecendo
o crescimento.
De
acordo com Souza, o processo de descontaminação utilizado
atualmente, além de dispendioso, é ineficiente, por não
garantir a remoção de todo o metal contaminante. As tecnologias
ex-situ removem a parte superior do solo, o que prejudica
a fertilidade e a estrutura física do local.
Espécies arbóreas contribuem
para a estabilização de metais
No trabalho da bióloga Sarah,
as plantas arbóreas eritrina e sansão do campo apresentaram
características importantes para fitoestabilização do solo,
processo em que espécies tolerantes a determinados metais
conseguem concentrá-los em sua raiz, evitando a contaminação
de plantas mais sensíveis. Germinadas em casas de vegetação
do próprio instituto, as espécies foram submetidas a doses
crescentes de chumbo e zinco para testar sua tolerância e
respostas fisiológicas sob estas condições.
De acordo com Sarah, as espécies
arbóreas analisadas por ela apresentaram tolerância aos metais,
o que as caracteriza como potenciais fitoestabilizadoras do
solo. Ela explica que a estabilização é possível porque a
maior parte do metal se concentrou na raiz, que acaba atuando
como uma barreira, impedindo que os metais cheguem à parte
aérea das plantas, incluindo caule e folhagem, e causem mais
efeitos danosos. Sarah explica que diferentemente das espécies
herbáceas, as plantas arbóreas não são utilizadas para fitoextração
de contaminantes já que a maior parte dos metais absorvidos
fica retida na raiz. No entanto, quando tolerantes, podem
controlar e “revegetar” áreas contaminadas. São elas que favorecem
o crescimento de outras plantas menos tolerantes, segundo
a bióloga.
A eritrina poderia ser usada
para controle de solos contaminados com zinco, uma vez que
foi mais tolerante a este metal que as outras espécies estudadas.
Já o sansão do campo mostrou-se mais sensível ao zinco, que,
por sua vez, foi mais sensível aos altos níveis de chumbo
no solo.
Apesar
de se mostrarem sensíveis a um ou outro metal, as plantas
estão dentro do padrão de tolerância utilizado pelos pesquisadores,
segundo Sarah. “Já que trabalhamos com plantas na fase estádio
de muda, que é uma etapa do desenvolvimento mais sensível,
elas são relativamente tolerantes, se considerarmos o padrão
que temos”, acrescenta. Segundo a cooorientadora Sara Adrián
López de Andrade, na fitoestabilização as plantas e os microrganismos
associados atuam para que os metais fiquem de forma menos
disponível no solo e não prejudiquem o desenvolvimento de
outras plantas e microrganismos mais sensíveis do sistema
edáfico (relativo ao solo).
Sarah lembra que a contaminação
do solo por metais pesados, causada por processos naturais
ou pela atividade humana, é um dos mais sérios problemas ambientais,
devido à persistência e de seu alto poder de toxicidade, além
de provocar efeitos prejudiciais, diminuindo a qualidade dos
ecossistemas e impedindo o desenvolvimento da agricultura.
Ela acrescenta que em ambientes contaminados, as plantas podem
apresentar uma série de distúrbios fisiológicos e nutricionais,
entre eles diminuição da produção de biomassa, clorose, inibição
da fotossíntese e alteração no balanço hídrico e hormonal.
Publicação:
Dissertação de mestrado Tolerância
aos metais pesados chumbo e zinco e potencial fitorremediador
de mudas de espécies arbóreas
Autora: Sarah Caroline Ribeiro de Souza
Orientadora: Marlene Aparecida Schiavinato
Unidade: Instituto de Biologia (IB)
Financiamento: Fapesp
|
Simbiose com fungos atenua
ação nociva
A pesquisa desenvolvida
pelo biólogo Lucas Anjos de Souza mostra que plantas herbáceas
também podem atuar como fitorremediadoras. A pesquisa revelou
que a associação de fungos micorrízicos com algumas herbáceas,
como o calopogônio (Calopogonium mucunoides), pode potencializar
o crescimento e a ação fitoestabilizadora das plantas em
solos contaminados por chumbo. O estabelecimento da simbiose
com fungos micorrízicos, segundo a coorientadora Sara Adrián,
pode aumentar a tolerância das plantas às condições de estresse.
“As plantas colonizadas por estes fungos têm, no geral,
tolerância maior que plantas não-colonizadas em condições
de estresse”, explica Sara.
O pesquisador concluiu que,
apesar de ter papel importante na tolerância de calopogônio
à contaminação por chumbo, a micorrização não teve efeito
relevante nas herbáceas feijão espada (Canavalia gladiata)
e mucuna preta (Stizolobium). Por outro lado, o processo
favoreceu o acúmulo do metal em calopogônio e em feijão
espada, mas não em mucuna preta. A micorrização mostrou-se
fundamental apenas ao desenvolvimento de calopogônio na
presença de chumbo”.
A pesquisa desenvolvida
por ele extrapolou a análise da tolerância e contemplou
também o efeito dos metais nas espécies. “Fomos além dos
parâmetros de crescimento e fisiológicos, avaliando também
as relações simbióticas de leguminosas com bactérias fixadoras
de nitrogênio e com fungos micorrízicos, que são de grande
importância para o correto desenvolvimento destas espécies
e a consequente revegetação de áreas degradadas”, explica
Souza.
Na busca de descobrir se
as plantas podem ou não ser consideradas fitoextratoras,
o pesquisador constatou que, apesar de a colonização evitar
o acúmulo excessivo de chumbo nas plantas durante a germinação,
o crescimento da parte aérea e das raízes foi afetado de
forma diferente em cada uma. De acordo com Souza, para considerar
uma planta como fitoextratora, a concentração de metal absorvida
nos diferentes tecidos ou órgãos da planta tem que chegar
a um determinado valor que no caso do chumbo é de 1.000
miligramas por quilo de matéria seca produzida. No caso
das espécies investigadas, a concentração na parte aérea
da planta chegou a 600 miligramas por quilo, colocando-as
como promissoras ao extrair consideráveis concentrações
de chumbo do solo.
Mesmo não se comportando
como fitoextratoras, as espécies podem ser consideradas
removedoras de chumbo do solo, o que as caracteriza como
potenciais fitorremediadoras. “Elas são eficientes. Só não
consideradas fitoextratoras pela questão da concentração
absorvida do metal contaminante”, explica Souza.
O pesquisador explica que
os metais concentrados na parte aérea podem ser removidos,
se economicamente viável, por processos de biomineração.
Outros elementos como o zinco, micronutriente essencial
para o desenvolvimento vegetal, podem ser reaproveitados
como adubo no desenvolvimento de outras plantas deficientes
desse nutriente, segundo Souza.
A orientadora das dissertações,
professora Marlene Aparecida Schiavinato, explica que o
zinco, quando usado na quantidade certa, pode colaborar
para o desenvolvimento de algumas plantas. Ela explica que
se as plantas com capacidade para absorver o metal do solo
conseguem transportá-lo para a parte aérea, elas devem ser
cortadas e retiradas do local antes da floração para a extração
total dos metais, a fim de reduzir a contaminação do solo.
“Isso pode ser realizado várias vezes até que a contaminação
seja reduzida”, acrescenta Marlene.
Souza enfatiza que o chumbo
é cumulativo nos organismos vivos e não possui nenhuma função
fisiológica vital conhecida até o momento. Em solos que
não sofreram influência humana, o metal aparece, normalmente,
em baixas concentrações. As técnicas empregadas até o momento
para remoção de contaminantes são laboriosas e caras, e
a técnica de fitorremediação pode ser uma alternativa mais
econômica reduzindo os custos de organismos públicos ou
privados na recuperação de solos contaminados, na opinião
do pesquisador.
Souza acrescenta que o desenvolvimento
de novas tecnologias está intimamente relacionado ao aumento
da poluição ambiental. O mais preocupante, na sua opinião,
é quando a contaminação ocorre em solos agriculturáveis
e leva, consequentemente, à contaminação de animais e seres
humanos, transferindo os metais contaminantes de um organismo
para outro.
A constatação de que a micorrização
pode estimular o desenvolvimento de plantas sob condições
de estresse pode dar origem a novos experimentos e novas
tecnologias verdes que possibilitem a inoculação de fungos
micorrízicos nas espécies de interesse para facilitar ou
promover a fitoestabilização dos metais no solo.
De acordo com a coorientadora
Sara Adrián, os pesquisadores investigaram a ação individual
de cada metal no desenvolvimento das plantas, mas “ainda
não sabemos qual seria a tolerância das plantas em solo
multicontaminado. Um metal pode interferir na absorção ou
na toxicidade de outro, mudando completamente as respostas
das plantas. E essa é a situação encontrada normalmente
em solos contaminados, a coexistência de vários metais ou
elementos potencialmente tóxicos em níveis excessivos”,
explica Sara.
Apesar de optarem por enfoques
diferentes, os pesquisadores realizaram um trabalho de colaboração
mútua, já que todo o processo do experimento, desde a preparação
do solo até as determinações analíticas, foi muito similar.
“É uma oportunidade importante de desenvolvermos nossas
pesquisas com a colaboração de outros pesquisadores envolvidos
em projetos relacionados. Isso possibilita a ampliação de
conhecimentos. Nesses trabalhos, por exemplo, pudemos contar
com a colaboração da Sara Adrián, que veio desenvolver seu
pós-doutorado e acabou atuando como coorientadora”, diz
Souza.
Publicação:
Dissertação de mestrado “Potencial fitorremediador de
leguminosas herbáceas associadas a fungos micorrízicos
arbusculares em solo contaminado com chumbo”
Autora: Lucas Anjos de Souza
Orientadora: Marlene Aparecida Schiavinato
Unidade: Instituto de Biologia (IB)
Financiamento: Fapesp
|
|
|