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Simulação computacional detalha
comportamento de redes ecológicas
Programa desenvolvido por física
permite estudo de interações complexas
Um
estudo desenvolvido a partir de simulação computacional pela
física Andréia Nalú Soa- res Hisi, do Instituto de Física
Gleb Wataghin (IFGW), revelou dados importantes sobre o comportamento
de redes ecológicas, nas quais grupos de espécies interagem
por meio de predação. Um dos resultados importantes da pesquisa,
orientada pelo professor Marcus Aloízio Martinez de Aguiar,
mostra que quando deslocadas de suas posições de equilíbrio
e expostas a eventos catastróficos, as espécies podem apresentar
grandes oscilações antes de se reequilibrarem. Segundo Andréia,
as grandes oscilações podem levar as populações à extinção
ou a valores tão baixos, como no efeito Allee – em que a taxa
de sobrevivência de uma espécie está abaixo do mímimo necessário
para que ela possa se recuperar. O programa permite, a partir
de redes simples, estudar o comportamento de interações complexas.
De acordo com Andréia, o
estudo mostrou que quanto maior for a amplitude das oscilações
das populações, mais sensíveis à extinção serão as espécies.
“Se os recursos são abundantes, as populações de presas podem
aumentar para valores grandes, conduzindo a população de predadores
a um aumento equivalente. Isto, por outro lado, leva à extinção
das presas menos predadas e também pode acabar eliminando
um dos predadores”, acrescenta. Os dados foram obtidos a partir
de uma modelagem do sistema de predadores e presas feita com
a introdução de um limiar de extinção, o qual quantifica a
capaci- dade de uma espécie de se recuperar a partir de uma
redução populacional.
Entre outros resultados obtidos na pesquisa,
Andréia observou que após grandes reduções populacionais,
o número de espécies que compõem a rede e as relações entre
elas afetam suas respectivas capacidades de recuperação.
A pesquisadora diz ter se surpreendido também com a análise
de estabilidade com relação a eventos catastróficos, a qual
para o caso mais simples – uma rede de dois pares predador-presa
– mostrou que o acoplamento entre os pares torna o sistema
mais vulnerável à extinção e o efeito da interação parece
ser importante apenas quando os efeitos Allee não estão presentes.
Andreia começou o estudo
por meio da simulação de uma dinâmica de rede de quatro espécies
– dois pares de presa-predador ligados por uma interação assimétrica,
em que o predador do primeiro par também se alimenta da presa
do segundo par. O modelo revelou que a taxa de sobrevivência
das populações mais predadas em redes ecológicas é a maior
entre todas as espécies. Outra observação é de que a presa
menos caçada e o predador de uma única presa sentem mais fortemente
os efeitos deste acoplamento, tendo suas populações reduzidas
conforme cresce o valor desse acoplamento. Ao acrescer mais
pares na rede, a pesquisadora constatou que as extinções ocorrem
em cascata, de acordo com o arranjo das espécies na rede de
interações.
A autora observou o aparecimento
de uma grande população do predador que caça mais, já que
ele dispõe de mais recursos, e mesmo assim encontrou evidências
de que a espécie mais predada acaba sendo mais abundante que
a menos predada. Segundo a autora, a competição aparente pode
afetar fortemente o destino das espécies que interagem entre
si. Ela explica que o rápido aumento na densidade do predador
mais voraz reduz a população de sua presa principal, o que
reduz a sua própria população. A autora encontra nas equações
que descrevem o equilíbrio o argumento que elucida o processo:
“A densidade populacional da presa menos predada é uma constante
e, desta forma, o predador mais voraz, por depender diretamente
dela, é muito estável, enquanto as densidades de equilíbrio
das demais populações estão mais sujeitas aos parâmetros de
acoplamentos e sofrem mudanças conforme estes parâmetros variam”.
Sobrevivência
A pesquisadora reforça a importância
do avanço em estudos que permitam compreender a in- fluência
da perda ou introdução de espécies na estabilidade de redes
ecológicas, já que tanto em estudos anteriores quanto nos
resultados de sua pesquisa há a confirmação de que as extinções
podem levar à simplificação dos sistemas ecológicos, tornando-os
mais frágeis.
Um ponto importante em estudos como o realizado
para a tese, que abordam o declínio da biodiversidade da Terra,
é a verificação da grande capacidade de recuperação de cada
uma das espécies envolvidas. Segundo Andreia, todas apresentam
limiares de sobrevivência, havendo persistên- cia da rede
inteira ou fragmentada, mesmo para condições iniciais menores
do que 50% de seu valor de equilíbrio, como um resultado natural.
Além
disso, pesquisas recentes, anteriores à sua, revelam que a
flora e a fauna mundiais estão desaparecendo em taxas maiores
que os eventos de extinção em massa. “Neste caso, tanto a
teoria quanto a prática têm indicado duas coisas fundamentais:
a primeira é que muitos ecossistemas têm manifestado a capacidade
de resistir a perdas sem qualquer colapso, como os resultados
de nosso trabalho descrevem corretamente. A segunda confirmação
é de que a multiplicidade de espécies de presas e predadores
resguarda o sistema de mudanças abruptas quando uma destas
espécies sofre redução de abundância. Isso significa que dentro
de um ecossistema, a diversidade apresenta uma relação com
a estabi- lidade do sistema”, explica Andréia.
Pleistoceno
Ao analisar uma provável rede
sul-americana de mamíferos do final do Pleistoceno, Andreia
observou que em caso de extinções em massa, provocadas por
ações humanas ou mudanças ambientais, a rede pode ser reduzida
à metade. Essa dinâmica pode remeter a um potencial alto de
perda de biodiversidade, já que nesta rede as espécies apresentam
menos de três conexões entre si.
A autora esclarece que a modelagem
referente à extinção da megafauna do Pleistoceno é um problema
extremamente complicado, por estar submetida a suposições
sobre a análise e a interpretação dos dados existentes. Ela
acrescenta que, apesar dos progressos na discussão do tema,
o debate sobre a responsabilidade da atuação humana requer
estudo mais aprofundado. Também merecem aprofundamento as
questões relacionadas a padrões e processos ecológicos, como
os referentes às oscilações populacionais, variação entre
as regiões geográficas na disponibilidade de recursos alimentares
secundários e competi- ção por alimento entre as espécies.
Ela afirma que, em dados divulga-
dos na edição de dezembro de 2010 da Revista Fapesp, a escala
da redução de populações de espécies é generalizada e muito
grande, chegando a atingir cerca de 20 milhões de animais
selvagens mortos por ano, apenas em regiões como a África
Central. As principais causas podem estar ligadas à perda
e à fragmentação dos habitats ou à caça. De acordo com a publicação,
nas áreas acometidas por esses eventos, a população é 30 vezes
menor que em áreas de preservação.
Outro dado que chama sua atenção
na mesma publicação é que no território brasileiro encontram-se
35% das espécies de mamíferos que estão ameaçados em todo
o mundo. Tal informação, para ela, é assustadora, se levar
em conta o fato de que os mamíferos são responsáveis por mais
de 30% da dispersão de plantas da mata atlântica. Diante desses
dados, Andréia acredita que o desenvolvimento de métodos e
técnicas para obtenção de comunidades em redes deve extrapolar
o ambiente acadêmico para ser tratado como políticas públicas
de desenvolvimento e preservação.
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Publicação
Tese: Dinâmica de População em Redes
Ecológicas: Persistências, Catástrofes e
Extinções
Autora: Andréia Nalú Soares Hisi
Orientação: Marcus Aloízio Martinez de Aguiar
Unidade: Instituto de Física Gleb Wataghin
(IFGW)
Financiamento: Bolsa Big Unicamp e Capes |
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