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As obras públicas de Zenon
Barreto, um artista esquecido
Jornalista analisa seis esculturas
e cinco
painéis do pintor e escultor cearense
A
escultura Iracema Guardiã, na praia de Iracema, é um conhecido
cartão-postal de Fortaleza. A obra, com mais de seis metros
de altura, se impõe na paisagem. Seu autor, o cearense Zenon
Barreto, no entanto, é pouco referenciado na historiografia
dos artistas de seu Estado natal. O artista teve expressão
nacional, ganhou prêmios importantes e vivenciou, entre as
décadas de 1940 e 1970, o auge de sua carreira.
“Mesmo com uma produção artística
importante, existe uma lacuna na história dos artistas cearenses;
Zenon Barreto não é exceção. Ele teve reconhecimento nacional
expressivo, além de uma obra pública significativa. Ainda
assim, as análises sobre seus trabalhos são raríssimas no
meio acadêmico”, observa a jornalista Sabrina Albuquerque
de Araújo Costa, autora de dissertação apresentada ao Instituto
de Artes (IA), sob orientação da professora Maria de Fátima
Morethy Couto.
Sabrina relata que são poucas
as informações sobre o pintor, desenhista, gravador, escultor,
cenografista e ilustrador nascido em Sobral, no ano de 1918.
Sua morte ocorreu em 2002, aos 84 anos e, por isso, a importância
de se resgatar os aspectos históricos e artísticos dele e
de outros artistas nordestinos, visto que uma das vertentes
do trabalho realizado por Sabrina foi contextualizar a produção
artística cearense no cenário nacional. “Não fazia ideia de
quanto a falta de informações poderia prejudicar o trabalho
de resgate”.
Ao todo, a jornalista selecionou
para análise seis esculturas e outros cinco painéis que compõem
um conjunto de obras públicas expressivas do artista. Em quatro
das esculturas instaladas ao ar livre, os temas remetem a
mulheres às voltas com ofícios típicos do Estado do Ceará.
A Rendeira, Pilando, Mulher com pote e Cafuné foram feitas
para o Palácio da Abolição, antiga sede do governo do Estado;
têm estrutura em ferro e são cobertas com cimento, com altura
aproximada de 1,20m. O monumento a Bárbara de Alencar é outra
escultura da lista analisada por Sabrina. Feita na década
de 60, a heroína foi escolhida como ícone para retratar a
mulher cearense.
Iracema guardiã diz respeito
à personagem protagonista do romance homônimo do escritor
José de Alencar. Trata-se de uma obra figurativa com tendência
abstrata e de maior expressão de Zenon Barreto, mas demorou
exatos 30 anos para ser realizada. Isto porque o projeto ficou
engavetado desde meados de 1960, quando foi elaborado, até
1996, ano de sua inauguração.
Os painéis também representam
a expressão plástica do artista. Os Estivadores – um mosaico
que retrata a área portuária da cidade e que foi instalado
no Centro dos Exportadores – foi restaurado depois de permanecer
mais de 20 anos abandonado. Outros dois painéis de destaque
são Telefonia e Trabalhadores do Campo, com mais de oito metros
de largura e feitos sob encomendas, respectivamente, de uma
empresa de telefonia e do Departamento de Estradas de Rodagem
(DER), que queriam enfeitar as fachadas de suas sedes.
O
painel Peixes foi recentemente considerado uma obra pública,
visto que antes estava instalada em um prédio residencial.
No entanto, hoje o local abriga uma agência bancária. O desenho
que inspirou o último painel da lista, o Jangadas, que compõe
a fachada do Museu de Arte da Universidade Federal do Ceará,
foi premiado, em 1961, pelo Museu de Arte Moderna do Rio de
Janeiro. “Talvez este seja um dos prêmios mais importantes
no currículo artístico de Zenon”, destaca Sabrina.
De uma maneira geral, as
obras públicas foram feitas sob encomenda e seus respectivos
processos de confecção, caracterizados por limitações impostas
ao artista. “Tais interferências revelam a relação tensa e
polêmica que caracteriza as encomendas e concursos para aquisição
de obras públicas, sejam seus contratantes o poder público
ou a iniciativa privada”, analisa a jornalista. Segundo Sabrina,
assim como os painéis, todas as esculturas são trabalhos celebrativos.
Os primeiros, explica, têm como protagonistas o trabalhador
braçal enquanto as esculturas valorizam personagens e tipos
femininos caros ao imaginário popular nordestino. “A simplificação
da forma é outra constante nas obras de Zenon, embora o artista
tenha feito uso deste recurso com objetivos diferentes.”,
esclarece.
Em suas análises, Sabrina
Albuquerque não encontrou a obra cujo projeto foi elaborado
em meados de 1970. Trata-se de um monumento à Iemanjá, cuja
instalação seria na Praia do Futuro, um dos redutos dos religiosos
que cultuam a entidade, principalmente, aos finais de semana.
Segundo a jornalista, existe até mesmo o registro de inauguração
da escultura em meados de 1990 nos jornais da cidade, mas
a estátua não está no local. “Como o artista já faleceu, não
é possível obter informações sobre o paradeiro da obra. Desconfio
que tenha havido resistência em elaborar o projeto por parte
das autoridades, mas se trata apenas de uma suposição. Não
há registros do que realmente aconteceu. Isso mostra o descaso
para com o patrimônio artístico cearense”
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Publicação
Dissertação: “A arte pública de Zenon Barreto
na cidade de Fortaleza”
Autor: Sabrina Albuquerque de Araújo Costa
Orientadora: Maria de Fátima Morethy Couto
Unidade: Instituto de Artes (IA)
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