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Som para todos os ambientes
Pesquisador desenvolve sistema de áudio para projeção sonora
tridimensional
JEVERSON
BARBIERI
Imagine
poder escutar o som de um instrumento musical, executado através
de uma projeção sonora, com a mesma qualidade se o músico
estivesse tocando ao seu lado, no mesmo ambiente. Essa realidade
já existe e foi desenvolvida pelo pesquisador Alexander Mattioli
Pasqual, da Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM). Trata-se
de um sistema de áudio para projeção tridimensional do som,
um dispositivo esférico que difere dos alto-falantes convencionais
porque possui uma distribuição espacial de energia sonora
feita por doze pequenos alto-falantes, controlados de forma
independente. A aplicação mais imediata dessa nova tecnologia
pode ser percebida quando se escuta um músico ao vivo e depois
a sua gravação. Pasqual explicou que é possível perceber a
diferença dos sons porque a distribuição de energia no espaço
do instrumento musical é diferente da distribuição do alto-falante.
“Chamamos essa distribuição de energia de assinatura espacial.
Com o novo dispositivo, conseguimos aproximar as assinaturas
espaciais do instrumento e do alto-falante”, assegurou o pesquisador.
Sob a orientação do professor
José Roberto de França Arruda (FEM), Pasqual contou que a
pesquisa foi desenvolvida em parceria com o Laboratório de
Mecânica e Acústica do Centre National de La Recherche Scientifique
(CNRS) de Marselha (França), referência mundial em acústica.
De acordo com o pesquisador, esse tipo de equipamento não
existe no mercado e que, portanto, seu trabalho foi estudar
as potencialidades do equipamento, quais os tipos de distribuição
espacial que se consegue ou não reproduzir, as restrições
em termos de bandas de freqüência, projetos de equalizadores,
técnicas de otimização e, também, as suas limitações.
Para o pesquisador, do ponto
de vista da engenharia, houve um avanço significativo nos
estudos de acoplamento de alto-falantes. O normal em um sistema
de som é ter vários alto-falantes operando em diferentes faixas
de freqüência e, portanto, o funcionamento de um não interfere
no outro. No caso do novo dispositivo, doze alto-falantes
trabalham na mesma faixa de frequência e existe um acoplamento
entre eles, ou seja, o som de um interfere no outro. Foi necessário
o desenvolvimento de modelos físicos e matemáticos para conseguir
prever esse comportamento e poder projetar um dispositivo
de forma mais eficiente. “Desenvolvemos modelos eletromecânicos
e eletroacústicos e avançamos bastante mostrando o que somos
capazes de reproduzir em termos de distribuição espacial com
arranjos esféricos. Propomos uma nova base vetorial para representar
essa distribuição de energia sonora no espaço, gerada por
uma fonte esférica. Isso impacta na nossa técnica de controle,
que acaba sendo mais simples e eficiente do que tem sido desenvolvido
em outros laboratórios”, afirmou Pasqual.
Em termos técnicos, trata-se
de uma aproximação modal, chamada de modos de radiação acústica,
desenvolvida especialmente para esse tipo de dispositivo esférico.
“Após a realização de todos os cálculos para determinar esses
modos de radiação acústica, com esse tipo de arranjo esférico
de alto-falantes, usamos isso como base para representar a
diretividade do som. E essa nova aproximação modal talvez
seja a maior contribuição científica desse trabalho”, revelou
o pesquisador.
Protótipo
Utilizando uma técnica chamada de prototipagem virtual, a
esfera de nylon foi fabricada a partir dos desenhos fornecidos
pelos pesquisadores por uma equipe do Centro de Tecnologia
da Informação Renato Archer (CTI) – órgão do Ministério da
Ciência e Tecnologia (MCT). Através de uma impressora 3D,
as camadas de nylon vão sendo depositadas umas sobre as outras
de acordo com a configuração do desenho. “A peça veio pronta,
inclusive com toda a furação, sem que fosse necessário utilizar
qualquer processo de usinagem”, contou Pasqual.
O pesquisador afirmou que
a decisão pelo formato esférico se deu por conta da simetria.
O objetivo era reproduzir a diretividade sonora, que é o que
descreve a característica espacial do som. A diretividade
é a distribuição espacial de energia de uma fonte sonora.
“Queríamos reproduzir a diretividade no espaço tridimensional
completo e a esfera é o formato mais simétrico que existe.
A disposição dos alto-falantes, nesse caso, segue um dodecaedro
que é um dos cinco sólidos de Platão. Queríamos ser capazes
de fazer girar essa diretividade no espaço. Imagine, por exemplo,
que eu coloquei mais energia numa direção do que na outra
e quero girar essa direção em tempo real. Eu posso fazer isso
com a esfera devido à simetria”, explicou Pasqual.
Comparativamente a esse novo
dispositivo, o pesquisador disse que os sistemas de som existentes
no mercado atualmente, apesar de serem espaciais também, apresentam
limitações. A tecnologia do “cinema em casa”, que dispõe os
alto-falantes em torno do ouvinte – técnica de projeção de
fora para dentro – não permite posicionar uma fonte virtual
em qualquer local do espaço e restringe a mobilidade do ouvinte
à uma pequena área. O objetivo dessa técnica leva o ouvinte
a localizar onde está uma fonte sonora, criando sensações
nele. Pasqual revela ainda que já existem técnicas mais modernas
que tentam suplantar essas dificuldades, no entanto ainda
não estão disponíveis comercialmente.
A técnica de projeção sonora
realizada pelo novo dispositivo – de dentro para fora – possui
a vantagem de não se preocupar com a acústica do ambiente
onde ele está inserido. Sendo assim, há um aproveitamento
maior da nova técnica, porque é uma aproximação diferente.
No entanto, ainda não há uma previsão para que esse novo dispositivo
se torne comercial. “Ainda há muito trabalho pela frente.
Essa é uma fonte de doze canais que precisa de um sistema
dedicado para controlar os alto-falantes e isso não é tão
simples quanto parece”, garantiu Pasqual.
Aplicações
Existem, de acordo com o pesquisador, outras aplicações interessantes
desse dispositivo. Uma delas é para a música eletroacústica.
Como o dispositivo permite controlar a distribuição de energia
no espaço, ele pode ser utilizado também como instrumento
musical. O compositor pode utilizar, por exemplo, a rotação
dos padrões de diretividade em tempo real. “Assim, ele pode
utilizar isso como uma expressão a mais em sua composição,
capaz de criar efeitos nos ouvintes e isso no palco é muito
interessante”, acrescentou.
Outra aplicação seria evitar
microfonia em performances. Para isso, basta que o dispositivo
também tenha um sensor de posição do microfone e, de acordo
com o deslocamento no palco, criar um zero de pressão no microfone
para que não haja microfonia. “O dispositivo emite som para
todas as direções, menos para onde está localizado o microfone
no espaço”, disse Pasqual. A princípio, o dispositivo serve
apenas para reproduzir uma fonte pontual, no entanto, é possível
pensar na utilização para um quarteto de cordas, por exemplo,
onde cada instrumento teria uma fonte para reproduzir seu
som.
Cooperação
O contato com a equipe do Laboratório de Mecânica e Acústica
do CNRS de Marselha foi fundamental para o sucesso do trabalho,
contou Pasqual. Como essa área de áudio não possui uma tradição,
principalmente na área de engenharia mecânica, o pesquisador
afirmou que foi muito importante procurar essa parceria com
os pesquisadores franceses, que já possuem uma experiência
muito grande no assunto. “Tive um coorientador francês, professor
Philippe Herzog, que é um especialista em alto-falantes, e
todo o aparato experimental de que precisávamos para validar
os modelos teóricos para esse transdutor foi disponibilizado
pelo CNRS”, disse.
A pesquisa foi viabilizada
com uma bolsa de doutorado, tipo sanduíche, financiada pela
Capes. Durante onze meses, Pasqual realizou desenvolvimentos
teóricos e computacionais no CNRS e, numa segunda etapa, estagiou
no laboratório francês por três meses para fazer a parte experimental.
“Os resultados foram satisfatórios e essa cooperação internacional
foi muito importante para o meu aprendizado, não só científico
quanto pessoal, porque pude conhecer vários laboratórios que
desenvolvem fontes como essa”, concluiu.
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