papel
primordial de qualquer universidade é a criação
e disseminação de informações
e conhecimentos. Este dever tem sido consideravelmente facilitado
pelas milhares de alternativas oferecidas pelo mundo do software
livre. O software livre, desde o sistema operacional, representado
por sistemas como GNU/Linux, FreeBSD e vários outros,
e os milhares de aplicativos existentes, fornecem uma plataforma
para o desenvolvimento de praticamente qualquer tipo de solução.
Soluções administrativas e ferramentas para
pesquisa científica estão ao alcance de qualquer
pessoa que disponha de computadores tão simples como
um 486.
Apenas
para citar um exemplo nesta linha, o Centro de Pesquisas Agrícolas
da Unicamp (Cepagri), até pouco tempo atrás,
hospedava seu servidor Web em um computador modelo 486, 33MHZ,
com 16 MB de memória RAM. O Cepagri todos os dias tem
uma exposição na televisão, fornecendo
a previsão do tempo para a repetidora da Rede Globo
em Campinas (EPTV Campinas) e contabiliza milhares de acessos
diários. Seu servidor Web, além de fornecer
a previsão do tempo, disponibiliza também imagens
de satélite para download. Um fator a ser lembrado
é que com a rápida evolução dos
sistemas livres, a instalação e configuração
de um servidor Web pode ser feita com pouquíssima intervenção
do usuário, a maior parte do processo sendo totalmente
automatizada. Este serviço roda hoje em um computador
486/66MHZ, com 32 MB RAM.
De
longa data O uso de software livre no mundo acadêmico
já vem de longa data. Os softwares desenvolvidos pela
Free Software Foundation são referência obrigatória
para administradores de sistemas de todo o mundo. A instalação
de um sistema Unix proprietário geralmente é
demorada, porque em seguida à instalação
é necessário que se compile todo o conjunto
de aplicativos GNU.
Em 1994,
quando da instalação do Centro Nacional de Processamento
de Alto Desempenho em São Paulo (Cenapad), também
sediado na Unicamp, foi adotada uma solução
computacional baseada em computadores IBM/SP2. A grande maioria
das ferramentas para processamento paralelo era livre e gratuita.
Para processamento científico com computação
paralela, a solução adotada era o programa PVM
(Parallel Virtual Machine), também livre e gratuito.
No suporte aos sistemas eram empregadas ferramentas como AMD
(Automounter Daemon), SUP (Software Update Protocol), NTP
(Network Time Protocol). O software para gerenciamento de
tarefas, este proprietário da IBM, o LoadLeveller,
era baseado na versão pública do software Condor,
desenvolvido na Universidade de Wisconsin.
Dilema
terrível Nas universidades, até bem
pouco tempo, a maior parte do processamento científico
era feita em máquinas com sistemas Unix e o processamento
administrativo realizado em sistemas proprietários,
como os equipamentos de grande porte comercializados pela
IBM e diversos outros fabricantes. Esta opção
por plataformas proprietárias vem de muito tempo atrás,
quando não havia alternativas. Todas as soluções
existentes não se comunicavam com as demais. O dilema
para os administradores era terrível, pois qualquer
opção que se fizesse desembocaria inevitavelmente
em uma situação de aprisionamento, com o cliente
integralmente nas mãos do fornecedor, tanto em termos
das soluções oferecidas como dos preços.
A IBM,
por seu ótimo serviço de atendimento aos clientes
e pela excelência de seu hardware, capturou a maior
parte do mercado, a custos , em geral, extremamente elevados.
Algumas empresas fecharam os olhos e pularam em um modelo
único e fechado, ao passo que outras, ao optarem pela
diversidade de plataformas, se viram com a incumbência
não menos invejável de terem que gerenciar e
manter diversos ambientes, com os custos daí decorrentes
de manutenção de uma equipe de suporte e desenvolvimento
para cada um dos ambientes.
A questão
principal, entretanto, é que este modelo não
oferecia alternativas. Felizmente este não é
mais o caso. Alternativas, hoje, temos muitas. O mais difícil
é a mudança de mentalidade, em acreditar que
sistemas completos de gestão universitária e
para pesquisa, baseados em software livre, podem ser criados
e mantidos com custos muito menores do que sua contrapartida
proprietária. Sistemas proprietários, por definição,
constituem um tremendo obstáculo à inovação.
Estes obstáculos são o elevado custo de aquisição
de licenças e sua manutenção. Cada nova
funcionalidade ou serviço que se deseja oferecer representa
uma nova fonte de gastos. O controle dos softwares proprietários
instalados em cada computador, não é tarefa
fácil e representa uma grande dor de cabeça
para administradores de sistemas.
Site
da Unicamp Muito do conhecimento gerado em universidades
é inacessível ao público em geral, não
por um desejo de ocultá-lo, mas pela falta de mecanismos
adequados que o tornem disponível a todos que dele
necessitem. Uma das prioridades para o site institucional
da Unicamp foi estabelecer um indexador de todo o conteúdo
disponível na Web da universidade. Foram feitos experimentos
com indexadores conhecidos no mercado, como Altavista e Infoseek,
porém o altíssimo custo financeiro n a aquisição
de licenças para a indexação da quantidade
de informação disponível na Unicamp,
tornava esta alternativa inviável. Optamos, então,
pelo software livre htdig, que permitiu trazer à tona
para nossa comunidade de usuários muita informação,
que até então estava disponível a poucos.
Com isto tivemos uma sensível melhora no serviço
prestado à nossa comunidade.
O Centro
de Computação da Unicamp, em parceria com o
Instituto Vale do Futuro, coordena uma equipe de desenvolvimento
de aplicativos voltada à criação de componentes
para aprendizado a distância. Todos os aplicativos criados
serão liberados sob a licença GPL. O primeiro
destes componentes foi o sistema Rau-Tu de perguntas e respostas.
O objetivo principal deste sistema é criar um fórum
onde colaboradores voluntários possam responder a perguntas
dos visitantes. O primeiro sistema Rau-Tu teve como tópico
principal sistemas GNU/Linux. Poucos dias após o seu
lançamento, mais de 200 colaboradores haviam se inscrito.
Os colaboradores são pontuados de acordo com a qualidade
de seu trabalho e pela rapidez com que respondem às
per-guntas. As per-guntas feitas pelos visitantes são
rapidamente res-pondidas e, após a avaliação
feita pelo usuário, armazenadas em um banco de dados.
Um segundo sistema Rau-Tu já foi lançado, para
discutir tópicos relacionados com educação
a distância, e esperamos que, com o lançamento
de sua homepage e a disponibilização do código
fonte da versão 1.0, o número desses sistemas
se multiplique exponencialmente, gerando conhecimento para
toda a sociedade.
Liberdade
total Com software livre, a liberdade de criar
e inovar é total. A maioria dos softwares está
disponível na Internet a custo zero. Com o código
fonte disponível, tudo o que se exige é um pouco
de conhecimento para adequar o que existe às nossas
necessidades. Como exemplo posso citar um sistema de solicitação
e acompanhamento de serviços que era uma das metas
do Centro de Computação. Como era um software
para uso interno e também devido à grande
evasão de técnicos de informática que
se deu na Unicamp a partir de 1998 o sistema foi sendo
esquecido para atender a outras demandas prioritárias.
Estimativa-se que o desenvolvimento deste sistema iria requerer
o trabalho de aproximadamente seis técnicos, por um
período de seis meses, com um custo aproximado de R$
90 mil.
Na Internet
existem várias alternativas de softwares com esta função.
Resolvemos então investigar um software chamado Request
Tracker, desenvolvido em Perl e com banco de dados MySQL.
Fizemos a instalação e constatamos que atendia
a mais de 90% do projeto original. De posse dos fontes em
Perl, iniciamos a tradução do pacote e fizemos
também algumas adaptações na interface.
A tradução do software foi feita em dois dias
e a adaptação da interface consumiu mais quatro
horas. A versão traduzida será disponibilizada
no site do desenvolvedor, para quem mais dela precisar se
valer.
De tudo
o que foi dito acima, é claro que uma grande economia
pode ser feita com a adoção de alternativas
baseadas em software livre. A economia de recursos, entretanto,
não é o ponto principal e sim a liberdade de
se poder escolher. A sociedade baseada na informação,
que vem se delineando nos últimos anos, está
criando novos divisores, novos fatores de exclusão.
O uso
de software livre é um fator estratégico para
o desenvolvimento nacional, para a competitividade de nossos
produtos no mercado mundial e para a melhoria de nossa qualidade
de vida. O pioneirismo da administração do Rio
Grande do Sul é um exemplo que precisa ser seguido,
e rápido, por toda administração pública
municipal, estadual e federal. Muitas empresas já se
deram conta desta realidade, mas ainda existe muito a ser
feito. Precisamos começar. Rápido.
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Rubens
Queiroz de Almeida é gerente da Divisão
de Serviços à
Comunidade do Centro de Computação da Unicamp